Discreta, mas falante: Cristine Paes é a primeira-dama mais longeva do Rio

Ela aprendeu a circular nas rodas do poder e achou seu espaço na área social da prefeitura que o marido comanda pela quarta vez

Por Fernanda Thedim Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO , Marcela Capobianco
17 jan 2025, 06h14
Cristine no Palácio da Cidade: sede da ONG RIOinclui e dos bazares que promove
Cristine no Palácio da Cidade: sede da ONG RIOinclui e dos bazares que promove  (Daniela Dacorso/Divulgação)
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Era feriado, mas Cristine Paes embalou na rotina de sempre, espantando a preguiça. Acordou cedo, dirigiu da residência oficial da Gávea Pequena à academia, no Leblon, onde fez aula de ginástica localizada, e voltou, esbaforida e com a sensação de dever cumprido. Eis que o celular toca. Era o marido, Eduardo Paes, a quem chama de Duda, recém-eleito prefeito do Rio pela quarta vez. Cristine não tinha percebido, mas a chamada era em vídeo e, ao abrir a câmera, desprevenida, encontrou do outro lado Brigitte Macron. A reunião da cúpula do G20 no Rio havia terminado no dia anterior, e o alcaide ciceroneava o presidente francês Emmanuel Macron e a primeira-dama em um breve tour na zona portuária. “Eu estava toda descabelada, comecei a ficar vermelha de nervoso e meu francês sumiu na mesma hora”, conta Cristine, ou Cris, como se apresenta, de 47 anos.

“Para piorar, ainda apareceu o Macron dizendo ‘bom dia’ em português, e eu sem saber o que fazer, o idioma que tinha que falar, toda suada e com o cabelo amarrado num coque no alto da cabeça. Quase matei o Eduardo depois”, relata, às gargalhadas, a mais longeva primeira-dama da história da cidade — a vice-campeã é Mariangeles Maia, mulher de Cesar Maia, que desempenhou por três vezes o papel.

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Nos primeiros mandatos, Cristine pouco aparecia, mas agora tem se revelado mais presente e mais à vontade na função, ganhando asas próprias. No Rock in Rio, circulou sozinha pela área vip, logo antes das eleições municipais, e brincou com a imprensa afirmando que, em solo carioca, ao contrário de São Paulo, não havia a menor possibilidade de uma cadeirada num debate (cena, aliás, para deletar da memória nacional).

Passado o pleito, ainda no início de dezembro, ela discursou em um evento da RIOinclui, ONG da qual é presidente de honra, e um convidado lembrou que, naquele momento, o prefeito, acomodado na plateia, era o coadjuvante. No Réveillon, de novo estava ela, ali com os pés descalços, curtindo os shows da virada em área reservada da prefeitura na Praia de Copacabana.

Com os filhos crescidos, um deles estudando fora do Brasil, Cristine passou a ter mais tempo livre. “Amadureci como mulher, mãe e profissional. Sempre fui tímida, aí virei primeira-dama e tive que começar a falar em público”, diz. “No início, ficava tensa, mas fui me tornando mais confiante, entendendo quem eu sou”, falou, em uma conversa de quase duas horas no Palácio da Cidade, que abriga a sede da ONG.

Apesar de os cariocas terem se acostumado à figura reservada, em geral quieta, ao lado do marido, ele expansivo e bonachão, quem a conhece bem garante que Cris, na intimidade, é bem diferente da imagem flagrada pelas lentes. “Ela tem raciocínio rápido, adora fazer piada e sacanear os amigos. Também é ótima em rir de si mesma. E não dá nem para discutir com ela, é sempre afiada”, conta a publicitária Joana Gadelha, sua amiga desde a adolescência.

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A primeira-dama não se furta a responder a nenhuma pergunta. Casamento? “É igual para todo mundo, com altos e baixos.” Gosta da folia? “Nasci numa terça-feira de Carnaval, amo. Mesmo que não curtisse, não teria como, porque meu marido já acorda cantando samba.” É romântica? “Claro, sou pisciana.” Já sofreu pressão de assessores para aparecer mais? “Jamais. Quem foi eleito foi o Eduardo, e ele entende isso, então tudo que resulta em exposição é conversado antes.”

Na última entrevista de VEJA RIO com o prefeito, em dezembro passado, ele avisou que iria comprar o presente de aniversário de 22 anos de casamento. “Quer saber a verdade? Ele me enrolou”, ela entrega. Sente raiva quando o marido é atacado nas redes? “Sinto é vontade de roubar o celular dele, para que não responda aos comentários”, dispara a primeira-dama, que mantém sua conta no Instagram fechada, restrita a uns 1 100 seguidores. “Nem deixo o Eduardo me marcar nas redes dele.”

Álbum de família

Registros da infância e momentos mais recentes

Foliã desde cedo: ainda criança e fantasiada, a primeira-dama nasceu numa terça-feira de Carnaval
Foliona desde cedo: ainda criança e fantasiada, a primeira-dama nasceu numa terça-feira de Carnaval (./Arquivo pessoal)
Garota carioca: Cristine estudou no Colégio Teresiano e viveu a adolescência no Leblon
Garota carioca: Cristine estudou no Colégio Teresiano e viveu a adolescência no Leblon (./Arquivo pessoal)
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O dia do sim: a cerimônia de casamento na Igreja São Francisco de Paula, no Centro
O dia do sim: a cerimônia de casamento na Igreja São Francisco de Paula, no Centro (./Arquivo pessoal)
Mãe de segunda viagem: com Bernardo bebê no colo, enquanto esperava Isabela
Mãe de segunda viagem: com Bernardo bebê no colo, enquanto esperava Isabela (./Arquivo pessoal)
Retrato de família: Cristine e Eduardo com os filhos já crescidos, na Gávea Pequena
Retrato de família: Cristine e Eduardo com os filhos já crescidos, na Gávea Pequena (Beth Santos/Prefeitura do Rio de Janeiro)
É tetra: a comemoração no dia em que Paes venceu a última eleição
É tetra: a comemoração no dia em que Paes venceu a última eleição (Beth Santos/Prefeitura do Rio de Janeiro)

A primeira-dama do Rio segue a trilha de outras no país — não possui funções oficiais dentro do governo, nem salário, e abraça a tradição de se envolver em ações beneficentes de forma voluntária. No Brasil, o costume vem dos anos 1940, quando Darcy Vargas (mulher de Getúlio) criou a Legião Brasileira de Assistência, a LBA, voltada às famílias de soldados enviados à Segunda Guerra Mundial. Nesse mesmo período, Eleanor Roosevelt, esposa do presidente americano Franklin Roosevelt, extrapolou o figurino. “A atuação dela na defesa da Declaração Universal dos Direitos Humanos na ONU foi fundamental”, cita o professor do departamento de ciência política da Uerj Paulo Henrique Cassimiro.

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Os tempos atuais, de tapetes estrelados, clicados e postados, deu a certas primeiras-damas aura de celebridade, caso de Michelle Obama e Janja da Silva, a atual dona do posto em Brasília — ambas afeitas aos holofotes, ao contrário da carioca, que se amoldou aos ritos do poder sem se desviar do trabalho no Palácio.

Cristine voltou as atenções para a Obra Social da Cidade do Rio de Janeiro em 2009, no primeiro ano da gestão Paes, e decidiu reposicionar a instituição. Engenheira elétrica formada pela Uerj, foi cursar arquitetura, um sonho antigo, após o nascimento do primeiro filho. Uma vez à frente da ONG, acabou unindo o útil ao agradável ao dar vida a um projeto que começou a rascunhar para trazer à luz no fim da faculdade, de moradias com acessibilidade para famílias com crianças e adolescentes portadores de algum tipo de deficiência e em situação de vulnerabilidade.

Rebatizada de RIOinclui, a associação filantrópica entregou mais de setenta dessas residências. “Quando o Bernardo (o primogênito) tinha uns 4, 5 anos, foi comigo numa cerimônia de entrega de casa e abriu a geladeira. Na mesma hora, perguntou: por que não tem comida? Morri de vergonha, mas acabou sendo bom. Passamos a distribuir também cestas básicas às famílias assistidas”, rememora.

Sem dinheiro público, só doações (a maior parte do bazar de moda, realizado todo ano no Palácio), a primeira-dama toca o projeto e dá expediente cerca de quatro vezes por semana, sempre à tarde. Seguindo a cartilha Paes, que vive passando o chapéu (“O Lula fica achando que eu peço tudo para ele. E eu peço mesmo”, disse o prefeito pós-G20 e já empenhado em trazer o próximo encontro do Brics para o Rio), Cris também não parece ter vergonha. “Vivo pedindo. E aproveito as oportunidades, né? No Carnaval passado, mandava o convite para o camarote da prefeitura com as informações do bazar junto, para dar aquela pressionada”, confessa.

O próximo deles, aberto ao público, acontece no final de abril, e Cristine participa pessoalmente da triagem dos itens a ser expostos, além de abastecer o estoque com blusas, vestidos e sapatos do próprio armário — e do prefeito também. “Doei várias peças, até o primeiro presente que o Eduardo me deu, em 1999, uma blusa de couro”, diz. “A arara da família Paes é sempre a primeira a esgotar. O público fica doido para comprar uma camisa do prefeito”, afirma Isabel Gimenes, CEO da RIOinclui, que entre 2021 e 2024 arrecadou 46 toneladas de roupas.

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Foco na inclusão: o trabalho da RIOinclui é voltado a moradias com acessibilidade para crianças e jovens com deficiência
Foco na inclusão: o trabalho da RIOinclui é voltado a moradias com acessibilidade para crianças e jovens com deficiência (Beth Santos/Prefeitura do Rio de Janeiro)

A primeira vez que os caminhos de Eduardo e Cristine se cruzaram foi numa pracinha da Selva de Pedra, condomínio do Leblon onde ela morava, quando o então vereador, já de olho na campanha para deputado federal, distribuía rosas num domingo de dia das mães. Ele bateu os olhos em Cristine, atravessou a praça e puxou assunto. “Você não tem cara de mãe, mas…”, disse, ao lhe oferecer uma flor.

O primeiro encontro deu-se só seis meses mais tarde, ao som de Sozinho, canção eternizada na voz de Caetano Veloso, em um bar de música ao vivo. Quatro anos depois, veio a troca de alianças, com toda a pompa, na Igreja São Francisco de Paula, no Centro. Ao descobrir-se grávida, Cristine precisou contar a novidade para o marido por telefone, à época vivendo em Brasília. Quando o bebê nasceu, a família se tornou a grande prioridade.

Ela largou o emprego em Furnas, até porque o salário “não era lá uma Brastemp”, e engatou na faculdade de arquitetura, que acabou não concluindo. Hoje, Bernardo e Isabela têm 20 e 19 anos, respectivamente. Ele mora nos Estados Unidos, onde cursa faculdade voltada para negócios, e ela está prestes a começar direito na Fundação Getulio Vargas, após um ano na Inglaterra. “Cristine é uma mãe onipresente, e os filhos estão sempre grudados nela. Mesmo grandes, se falam o tempo todo”, atesta a arquiteta Giani Faccini, amiga de infância e comadre.

Muitas vezes com os planos engolidos pela agenda do prefeito, a primeira-dama aprendeu a estar sempre pronta para mudar a rota. “Tem um trecho do livro da Michelle Obama em que ela diz que parou de esperar o marido (o ex-presidente americano Barack Obama) para jantar. Ele avisava que ia chegar em vinte minutos, dava trinta, quarenta, cinquenta e nada. Isso acontece direto lá em casa”, diz.

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Quando eles completaram 22 anos de união, o alcaide foi às redes, às quais definitivamente aderiu, para lhe dedicar declaração apaixonada. Na residência oficial, no Alto da Boa Vista, o casal não costuma conversar sobre política. “Meu papel é dar suporte emocional”, explica ela. “Construímos um projeto de vida juntos, com amizade, admiração, respeito e amor”, derrete-se o marido, que perdeu 30 quilos no ano passado, segundo ele, graças à insistência de Cristine.

“Duda estava com apneia do sono e as taxas dos exames de sangue, desreguladas, além de já ter infartado antes dos 50. Eu tinha cortado carboidrato à noite em casa e o incentivei a adotar uma alimentação mais leve. Faço um risoto com couve-flor no lugar de arroz que ele ama”, orgulha-se a primeira-dama, que não esconde a vaidade. “Botox, óbvio que já fiz”, declara. “De vez em quando, puxo a orelha dela porque esquece do skincare. Mas ela vive me ligando, querendo testar um procedimento novo”, revela a dermatologista Karla Assed, prima de Cristine.

Descendente de libaneses, Cristine Paes nasceu Cristine Bussade Assed. “Minha família é cheia de médicos; acho ótimo porque não pago consulta”, faz graça. Morou a vida inteira no Leblon — teve uma infância e adolescência de playground e só ia “em bando” à praia e ao cinema do bairro —, estudou no tradicional Teresiano, na Gávea, e até hoje mantém reuniões com o grupo de amigos da infância. “Ela é a mesma Cris de sempre, jamais se deslumbrou com o posto de primeira-dama”, avalia a amiga Joana.

“A Cris é na dela e tem a clareza de que quem se elegeu prefeito fui eu. Então, faz seu trabalho social, mas leva uma vida independente dessa coisa de prefeitura”, arremata Paes. A primeira-dama confessa que não dispõe da mesma energia para o social que o marido e, muitas vezes, pula compromissos só para ficar sozinha em casa, quieta, lendo.

O ingresso na vida pública nunca chegou a ser cogitado, mas sonha seguir com um trabalho nos moldes da RIOinclui mesmo quando Paes deixar a prefeitura — “só em 2028”, garante ela, apesar de todas as especulações sobre uma possível candidatura dele ao governo do estado no ano que vem. Com toda a experiência acumulada, Cristine sabe muito bem: discrição é mandamento número 1.

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Boa de papo

O que pensa a primeira-dama do Rio

Política

“Meu papel é dar suporte emocional. O Eduardo é muito bom no que faz”

Casamento

“Tem seus altos e baixos, mas repetiria 10 000 vezes. Sou uma pisciana apaixonada”

Estilo

“Não ligo muito para marca. Roupa tem que ser confortável”

Filme

Filme
(./Divulgação)

“A Noviça Rebelde. A trilha sonora tocou até no meu casamento”

Viagem

“Vivi uma das experiências mais emocionantes ao visitar a casa em que meu bisavô nasceu, no Líbano, em 2019”

Exemplo

Exemplo
(Elza Fiúza/Agência Brasil)

“A Maria Silvia Bastos Marques, ex-presidente do BNDES e que agora está na Secretaria Municipal de Projetos Estratégicos, é uma mulher forte, que eu admiro e para quem bato palma”

Livro

Livro
(./Divulgação)

“O Avesso da Pele, de Jeferson Tenório, e A Paciente Silenciosa, de Alex Michaelides, foram dois que adorei no último ano”

Música

Música
(Leo Aversa/Divulgação)

“Amor, I Love You, da Marisa Monte, que cantávamos para o Bernardo quando ele era bebê”

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