Morre o sambista Arlindo Cruz, aos 66 anos
Um dos grandes nomes do samba, ele estava internado no hospital Barra D'Or; nos últimos tempos, já não respondia a estímulos
Um dos grandes nomes do samba, Arlindo Cruz morreu, aos 66 anos, nesta sexta (8). Ele estava internado desde no hospital Barra D’Or. A notícia foi dada pela viúva do cantor, Babi Cruz. Além da esposa, com quem estava há 37 anos, o cantor, compositor e instrumentista deixa os filhos Arlindinho e Flora Cruz, do casamento com Babi, e Kauan Felipe, fruto de um relacionamento extraconjugal.
Em março de 2017, aos 58 anos, o sambista sofreu um acidente vascular cerebral (AVC) hemorrágico enquanto tomava banho em casa, e ficou quase um ano e meio internado, grande parte desse período na UTI. Durante a recuperação, ele passou por catorze cirurgias — sendo cinco delas na cabeça —, além de ter sofrido embolia pulmonar. Desde então, ele tinha sequelas da doença e não fazia mais shows.
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Em 26 de março de 2025, Arlindo foi internado novamente. Chegou a ter alta médica em 18 de junho, mas, segundo a família, a instalação dos equipamentos de home care não foi concluída a tempo. Dias depois, apresentou uma piora no quadro geral e teve que retornar ao hospital.
Nos últimos tempos, ele enfrentava uma bactéria resistente. “Foram mais de trinta pneumonias, então, a gente acredita que ele vai reverter mais essa, sem dúvida”, declarou a esposa do artista, Babi Cruz, à época, à coluna de Fábia Oliveira no Metrópoles.
Além disso, o artista não respondia mais a estímulos, como fazia anteriormente. “Tivemos momentos lindos dele segurando copo, segurando biscoito… Hoje não temos mais isso do Arlindo. Hoje ele está bem dentro do mundinho dele, do universo dele. Bem distante”, contou Babi na recém-lançada biografia do artista, O Sambista Perfeito, de Marcos Salles.
Cria de Madureira
Nascido no Rio em 14 de setembro de 1958, Arlindo Domingos da Cruz Filho foi criado em Madureira, bairro que homenagearia em uma de suas músicas mais famosas, Meu Lugar. Filho do policial e músico amador Arlindo Domingos da Cruz, conviveu com a música desde cedo.
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Aos 7 anos, ganhou o primeiro cavaquinho. Aos 12, começou a tocar músicas “de ouvido” e aprendeu violão ao lado do irmão Acyr Marques. Estudou teoria musical e violão clássico na escola Flor do Méier, e começou a atuar como músico profissional em rodas de samba.
Foi assim que conheceu outro mestre, Candeia (1935-1978), que se tornou uma espécie de padrinho seu, quando tinha 17 anos. Foi o baluarte da Portela que o levou para tocar na roda de escola da escola como músico profissional pela primeira vez, ganhando cachê. Graças a ele, fez suas primeiras gravações.
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Aos 15 anos, foi para Barbacena (MG), para a escola preparatória de Cadetes do Ar. Ganhou festivais de música na cidade no município de Poços de Caldas, também em Minas. Quando voltou para o Rio, passou a frequentar a roda de samba do Cacique de Ramos.
Beth Carvalho (1946-2019) passou a frequentar o Cacique e a recolher composições entre os artistas da roda para gravar. No disco De Pé no Chão (1978), a Madrinha — como foi batizada por aquela geração de sambistas — levou os músicos da roda para o estúdio, para que eles reproduzissem a nova sonoridade que apresentavam.
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Surgia, assim, a chamada geração do pagode, que revelou nomes como Zeca Pagodinho, Jovelina Pérola Negra e o grupo Fundo de Quintal. Após passar por ela, Arlindo logo teve doze composições gravadas por outros intérpretes.
A primeira foi Lição de Malandragem, por David Corrêa. Em seguida, foi a vez de Grande Erro, registrada por Beth Carvalho, e Novo Amor, por Alcione.
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Entre os artistas que mais cantaram músicas de Arlindo, estão a própria Beth (Camarão que Dorme a Onda Leva, Jiló com Pimenta, Partido Alto Mora no meu Coração e A Sete Chaves) e Zeca Pagodinho (com Bagaço de Laranja, Casal Sem Vergonha, Dor de Amor, Quando Eu te vi Chorando).
Em 1981, Arlindo ganhou projeção como intérprete ao entrar para o emblemático grupo Fundo de Quintal, substituindo Jorge Aragão, que partia em carreira solo. Cantava, tocava banjo e compunha. Ficou na banda por doze anos, saindo em 1993. Com ela, gravou clássicos do samba, como Só Pra Contrariar e O Show Tem Que Continuar, que têm coautoria dele.
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Depois de deixar o grupo, chegou a fazer dupla com Sombrinha, outro egresso do Fundo de Quintal. Mas já em 1993 lançou o primeiro trabalho solo, o álbum Arlindinho (1993). De acordo com o Escritório Central de Arrecadação e Distribuição (Ecad), ele tinha 847 composições e 1844 gravações cadastradas.
Nos anos 1990, participou de diversas escolhas de sambas-enredos de sua escola de coração, o Império Serrano, tendo vencido a disputa em doze ocasiões. Em 2023, foi homenageado pela agremiação, que fez dele o tema de seu desfile.
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Também participou da composição de sambas para outras escolas. Na Grande Rio, foi um dos autores de Do Verde de Coarí, Vem Meu Gás, Sapucaí!, de 2008, e Das Arquibancadas ao Camarote nº 1, um Grande Rio de Emoção na Apoteose do Seu Coração, em 2010, quando a escola foi vice-campeão.
Na Vila Isabel, em 2013, com A Vila Canta o Brasil, Celeiro do Mundo, com o qual a escola venceu o campeonato. ambém compôs para a São Clemente e a Unidos da Vila Kennedy, da série C.
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Sua parceira com a cantora Maria Rita também trouxe bastante destaque para Arlindo. No disco que marca sua transição para o samba, a artista gravou seis músicas de Arlindo. Três delas se tornaram grandes sucessos: Tá Perdoado, Num Corpo Só e O Que é o Amor?. O álbum teve 150 000 cópias vendidas, recebendo um disco de platina, e ganhou o Grammy Latino de melhor álbum de samba.
O cantor também ganhou muita projeção no período em que integrou o elenco do programa Esquenta!, da TV Globo, apresentado por Regina Casé, entre 2011 e 2017. Também fez uma participação na novela Insensato Coração (2011), em que era tietado pela aspirante a famosa Natalie Lamour (Deborah Secco) enquanto tocava numa roda de samba.
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Arlindo usou drogas durante muito tempo, mas, segundo seu filho conta na biografia O Sambista Perfeito, ele estava distante da cocaína quando sofreu o AVC. “É claro que o histórico atrapalhou na recuperação, mas meu pai estava limpo. Há uns sete, oito meses sem cheirar”, garante Arlindinho.
Autor de clássicos como Meu Lugar, O Show Tem Que Continuar, Bagaço da Laranja e Camarão que Dorme Onda Leva, Arlindo lançou seu último trabalho em 2017, pouco antes de sofrer o AVC: o álbum 2 Arlindos, lançado de Arlindinho. Uma trajetória digna de muitos aplausos.

