Antiga Beneficência Portuguesa abrigará maior hospital privado do Rio
Comprado pela Rede D'Or, o complexo com cinco prédios na Glória terá, além de uma unidade médica com 500 leitos, faculdade de medicina e centro de pesquisa
Batizada inicialmente com o pomposo nome de Real e Benemérita Sociedade Portuguesa de Beneficência do Rio de Janeiro, a instituição, fundada em 1840, na Glória, tinha como objetivo atender os lusitanos mais desamparados na capital do Império. Dez anos mais tarde, as enfermarias do hospital recebiam portugueses acometidos pela primeira epidemia de febre na cidade. Com um pé no passado e o outro no futuro, uma nova história desse emblemático endereço ligado à saúde no Rio começa a ser traçada. Arrematado em leilão judicial por 60 milhões de reais, pela Rede D’Or, em 2013, o conjunto arquitetônico onde funcionou a Beneficência Portuguesa já está em obras e se transformará no maior hospital privado da cidade, com 500 leitos — a unidade do grupo em Copacabana tem 300 e a da Quinta da Boavista, 340, só para comparar. O empreendimento, que se chamará Glória D’Or e conta com investimento de 300 milhões de reais, será aberto em etapas. Concentrado no Edifício Santa Maria, construção da década de 70 com oito andares, o hospital propriamente dito tem inauguração prevista para 2019.
A expectativa é que, em pleno funcionamento, o Glória D’Or empregue 5 000 pessoas. Só a emergência, com entrada pela Rua Benjamin Constant — para as demais alas, o ingresso será pela Rua Santo Amaro —, terá capacidade para 20 000 atendimentos por mês. “Vamos recuperar um ícone da área médica do Rio e transformá-lo num complexo com tecnologia e infraestrutura comparáveis às dos melhores centros do mundo”, afirma Paulo Moll, vice-presidente da Rede D’Or São Luiz. “E ampliaremos o acesso da população com uma abrangência maior de convênios médicos nessa unidade”, acrescenta. A exemplo de algumas das maiores referências na união do atendimento de excelência ao ensino médico de ponta, como o Johns Hopkins Hospital e a Mayo Clinic Rochester, ambos nos Estados Unidos, o Glória D’Or não se limitará à assistência hospitalar. Na estrutura, com cinco prédios e 42 000 metros quadrados de área construída, funcionará uma faculdade de medicina e de enfermagem com capacidade para 2 000 alunos. O espaço ainda abrigará o Instituto D’Or de Pesquisa e Ensino, com cursos de extensão, pós-graduação e doutorado.
Ambientes para startups dedicadas à área médica e um pequeno museu da saúde no Rio também estão no projeto. “Teremos um centro integrado, em que a pesquisa, o ensino e a inovação caminharão junto com o atendimento no hospital. Em um círculo virtuoso, todos os setores se beneficiarão”, ressalta Marcelo Pina, diretor executivo da Rede D’Or. Essa etapa final, no entanto, só deve estar concluída em três ou quatro anos. A transformação envolve a reforma de três imponentes prédios do século XIX, tombados pelo Instituto Rio Patrimônio da Humanidade (IRPH), e um palacete do século passado. Necessariamente, as obras nesses espaços serão antecedidas por minucioso trabalho de adaptação e restauro. Mais de 1 000 fotos compõem o levantamento de itens como escadas monumentais, pilares de granito, balaústres de louça, pisos de mármore, grandes vitrais e obras de arte. “Essa é uma contribuição ímpar para a cidade. Além da revitalização do complexo hospitalar, teremos a recuperação de um raro exemplar de arquitetura neoclássica erguido na época do Império”, avalia André Zambelli, à frente da Coordenadoria de Conservação do IRPH.
Antes de ser adquirida pelo grupo D’Or São Luiz, a maior rede privada do país, com quarenta unidades hospitalares, a antiga Beneficência Portuguesa passou por um longo período de agonia. A instituição, que chegou a ser uma das mais importantes do Brasil, entrou em uma espiral de decadência a partir dos anos 90. Criada para atender portugueses em dificuldades no Rio e, depois, a colônia lusitana em geral, era bancada por associados. O pagamento em parcela única dava direito a cobertura médica total, do parto ao enterro. Com o tempo, a Beneficência, que já teve 25 000 sócios, foi obrigada a aceitar vários convênios médicos para manter-se em funcionamento. Mesmo assim, mergulhada em dívidas, fechou as portas em meados dos anos 2010. Sua história, ao que tudo indica, ganha um novo e promissor capítulo.