Luzes, glamour e badalação

Frequentada por gente abonada que busca exclusividade, a boate Miroir, na Lagoa, se destaca na noite carioca

Por Daniela Pessoa e Ernesto Neves
Atualizado em 5 jun 2017, 14h04 - Publicado em 24 abr 2013, 16h44
foto Fernando Frazão
foto Fernando Frazão (Redação Veja rio/)
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Numa área exclusiva da pista de dança, um homem engalanado, de calça e camisa social, sacoleja animadamente com três mulheres, quando uma cena chama a atenção de todos. De forma triunfal, um garçom leva ao grupo uma garrafa do champanhe francês Dom Pérignon Rosé adornada com uma vela faiscante. O efeito pirotécnico, que se repete pouco depois, é uma deferência a quem atinge a marca de 3?000 reais de consumação. Nesse caso, o alvo da saudação é o árabe Mohammed Al Handal, executivo de uma empresa com sede em Dubai e negócios nas áreas de petróleo, telecomunicações, transporte, construção e turismo no Oriente Médio. No dia seguinte, ele retorna e se refugia no camarote mais caro da casa com quinze mulheres e um garçom privé, numa farra que excede os 10?000 reais e rende gorjetas de 100 dólares a vários funcionários, do gerente ao faxineiro. Localizada numa área valorizada da Lagoa, a boate Miroir tornou-se o destino de abonados que, a exemplo de Al Handal, querem curtir adoidado a noite carioca. Com pouco mais de um ano em funcionamento, ela pode se vangloriar de outro feito. Está entre as cinquenta melhores casas noturnas do mundo no ranking da DJ MAG, revista inglesa que é referência em música eletrônica. “É a única boate que frequento, porque aqui o público é seleto”, diz a atriz Lucilla Diaz, com cigarrilha eletrônica em punho, acompanhada da amiga Nataly Crosio. “É um lugar para ver e ser visto, e a trilha me faz lembrar as noites em Ibiza.”

Veja os tipos mais comuns que são assíduos da casa

ilustrações Tiago Elcerdo
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foto Fernando Frazão
foto Fernando Frazão ()

Por ter como conceito proporcionar exclusividades sem limite ao cliente, a Miroir não se distingue pela grandiosidade ? salvo nos preços. Com capacidade limitada a 490 pessoas, ela se espalha por dois andares de uma mansão de 700 metros quadrados na Avenida Epitácio Pessoa. Faz o estilo “cabaré chique”, na definição do ator e empresário Luciano Szafir, um dos sócios do empreendimento. Principal responsável pela concepção do negócio, ele já teve clubes noturnos em São Paulo e na Ilha da Mandala, em Angra dos Reis. Sua maior inspiração, porém, veio de boates parisienses e nova-iorquinas que conheceu na virada dos anos 80 para os 90. Para manter a sintonia com as últimas tendências mundiais, o diretor artístico e DJ Beto Gionannetti, que elabora a programação da Miroir, viaja todo ano para Ibiza, Madri e Miami, a fim de garimpar novidades e amarrar contratos, que podem chegar a 100?000 reais por apresentação. Dessa forma, já passaram pelos pickups da casa estrelas internacionais da música eletrônica como o português Pete Tha Zouk, o australiano Christian Luke, o alemão Tocadisco e o italiano EDX. Tocaram também DJs convidados, caso de Olin Batista, filho do (ainda) bilionário Eike Batista, que fechou um camarote para prestigiar o caçula.

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Como o nome insinua (miroir é espelho em francês, e pronuncia-se mirroá), o ambiente interno está tomado por reflexos e ondas de LED coloridas. Assomam ainda no salão duas plataformas cilíndricas onde dançarinas se exibem trajando collant cravejado de cristais, echarpe de plumas, meias arrastão e salto alto. O espaço mais reservado são os catorze camarotes, ao alcance de quem esteja disposto a pagar entre 2?500 e 12?000 reais para ocupar um deles. Quanto mais privilegiada a vista para a cabine do DJ, maior o preço. Para muitos, não é só uma questão de conforto, mas, sim, um investimento com boa possibilidade de retorno. “O assédio aumenta”, constata o empresário Marcelo Medeiros, que se esbaldou em um desses cercadinhos vips na sexta, dia 12. “As mulheres ficam curiosas para saber quem são os homens que estão ali dentro.”

Vejas as mordomias oferecidas noite a dentro

Moças de olho em um bom partido e jovens sarados a fim de azarar são alguns dos tipos assíduos da casa, que prima por atrair um público heterogêneo. Na lista de frequentadores figuram socialites, artistas, empresários, modelos e turistas, que têm em comum certo poder aquisitivo. “Aqui só dá homem bonito e do melhor tipo: o que paga o seu drinque”, elogia Gabriela Laurentino, ao lado da amiga Lara Grander, ambas médicas catarinenses radicadas no Rio. Na quinta (11), o ator Alexandre Nero, o Stênio da novela Salve Jorge, e a efusiva Narcisa Tamborindeguy marcavam presença no salão, onde ecoa um repertório radical, estritamente limitado à música eletrônica. Por mais que o modismo tente se impor, na Miroir não há espaço nem para o sertanejo universitário de Michel Teló e Gusttavo Lima nem para o funk, em tese, irresistível de Naldo. Embalada pela trilha de house e hip-hop, a noite atinge seu pico às 2 da matina, quando o jogo de sedução fica intenso. A essa altura, o corredor no 2º andar que liga a pista de dança aos banheiros vira um ponto estratégico. Enfileirada na estreita passagem, a rapaziada observa o vaivém feminino e toma a iniciativa de puxar papo. Caso a cantada seja bem-sucedida, o casal recém-formado vai bebericar no bar ou ver corrida de submarino no terraço. “Gostei muito do clima intimista da casa”, aprovou o empresário californiano David Nance, em visita ao Brasil.

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Um dos motivos que ajudam a consolidar o clube carioca no mapa da balada mundial é seu sofisticado aparato tecnológico. Na entrada, os clientes recebem cartões magnéticos com chips que garantem atendimento personalizado (todos são sempre chamados pelo nome) e dão acesso a brinquedinhos como o Miroir Magique. Trata-se de um terminal touchscreen espelhado, com câmera de alta resolução, que permite tirar fotos e postá-las diretamente nas redes sociais. Para as moças que estão com os pés doloridos de tanto dançar em cima do salto, uma máquina importada da Itália, semelhante àquelas que vendem refrigerantes, libera confortáveis sapatilhas. Disponível em três tamanhos e nas cores preto, prata e dourado, cada par custa 25 reais. Se a ideia for retocar a maquiagem, basta fazer o cadastro gratuito em um totem e, em seguida, recorrer aos pincéis da maquiadora Emanuelle Guerra, que já trabalhou em semanas de moda do Rio e de São Paulo. Ela fica à disposição no banheiro do 2º andar. Se o problema for o cabelo revolto, nada de desespero: uma chapinha automática custa 2 reais. O alisamento capilar, item mais barato de todo o cardápio de mimos, é uma exceção em meio a preços inflados. Como se imagina, tanto paparico tem um custo alto para o consumidor. Mas, ao que parece, a turma que vai lá não reclama por desembolsar uma boa nota (o ingresso custa 200 reais para eles e 60 para elas), desde que em troca possa desfrutar um ambiente exclusivo e serviço de qualidade. “Não me arrependo de vir aqui toda semana”, afirma o engenheiro Ricardo Bresciani, acompanhado do analista de sistemas João Pedro Mazzoleni. Morador de Copacabana, ele torra na Miroir cerca de 2?000 reais por mês. “Trabalho para ostentar este estilo de vida de praia, academia e boate.”

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Como em qualquer lugar onde há fartura de álcool e se juntam mulheres bonitas e jovens com alta dosagem de testosterona, não existe bom gosto que impeça confusões. Na quinta, dia 11, um homem caiu ensanguentado no banheiro após levar um soco pelas costas, que ele jura não saber por quê. O agressor acabou retirado pelos seguranças. Na noite seguinte, quando a pista estava apinhada de gente, um estrangeiro que insistia em dançar de jeito atabalhoado deixou um copo cair no chão e também foi prontamente “convidado” a se retirar. Há dois meses, o cantor Maurício Mattar foi visto saindo carregado pelos seguranças e sendo colocado num táxi.

Seja pela dinâmica dos modismos, seja por qualquer outro revés para se firmar, a verdade é que as casas noturnas do Rio costumam ter vida efêmera. Não raro um endereço sucumbe após uma temporada de brilho, sendo rapidamente apagado da memória. Houve um tempo em que não era assim. Dos anos 70 em diante, a cidade ganhou pistas de dança marcantes. Símbolos de uma época em que os clubes adquiriam status de grife, elas duraram o suficiente para ser lembradas até hoje. A lista é longa e inclui New York City, Noites Cariocas, Crepúsculo de Cubatão, Resumo da Ópera, Baronetti e People. No entanto, nenhuma delas foi tão expressiva quanto a Hippopotamus, que funcionou em Ipanema de 1977 a 2001, atraía personalidades como Ayrton Senna e Pelé e ? que luxo! ? tinha Danuza Leão como promoter. “Durante anos, faltaram investimentos em novos pontos e o Rio deixou de ter espaços premium”, opina Allan Sant?Anna, do site Rio Festa. A julgar pelo que se vê na Miroir, certamente mais por cautela dos empresários do que por falta de animação dos cariocas da noite.

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