Pesquisa: na Maré, 57% das mulheres já sofreram algum tipo de violência

Em 34% dos casos, agressão é física; em 30%, tem cunho sexual; e em 45%, é psicológica

Por Da Redação
18 jul 2022, 14h48
violência doméstica
Violência contra a mulher: casa da vítima é o palco da maior parte das situações relatadas no Ligue 180 (6 336), e a faixa etária da maioria oscila entre 40 e 44 anos (2 146), sendo majoritariamente mulheres pretas e pardas (7 860). (Elza Fiúza/Agência Brasil)
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“Chegou em casa bêbado? Não responde, pega as crianças e vai para a casa de uma amiga. Se não der, dorme na rua”; “Operação policial? Fica perto de outras mulheres em um espaço considerado seguro para evitar abusos”; “Sofreu agressão? Melhor procurar a Unidade de Saúde ou buscar ajuda nas redes sociais. Nada de delegacia”. Os conselhos são de moradoras do Complexo da Maré, escoladas em violência de gênero. No conjunto carioca de 16 favelas, pouco mais da metade dos habitantes são mulheres e 57% delas declaram já ter sofrido uma ou mais formas de agressão nas esferas pública ou privada.

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Dentro desse enorme contingente feminino, apenas 2,5% procuraram instituições para denunciar as violências de que foram vítimas. É o que mostra uma pesquisa iniciada há dois anos pela a ONG Redes da Maré e a universidade inglesa King’s College London, em parceria com a UFRJ. O objetivo era entender que alternativas essa mulheres buscam para resistir, diante da falta de acesso às instituições e às políticas públicas, em um território dominado por grupos fortemente armados.

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Lançado na última sexta (15), o relatório “Práticas de Resistência para Enfrentar a Violência Urbana de Gênero na Maré” ouviu 60 mulheres em entrevistas, grupos de conversa e workshops. A pesquisa parte de um estudo anterior, também promovido pela Redes da Maré e pela universidade inglesa, que produziu dados quantitativos e os esmiuçou. A partir dali, os pesquisadores souberam, por exemplo, que a violência contra mulheres na região é física, em 34% dos casos, sexual, em 30%, e psicológica, em 45%. Na pesquisa qualitativa, o levantamento mais recente, o drama cotidiano que emerge dos números ganha um toque de realidade.

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O estudo mostra que soluções de curto prazo como as citadas no primeiro parágrafo são transmitidas em redes de apoio informais, entre amigas, vizinhas e em família, através de gerações. O relatório final da pesquisa deixa claro que serviços do estado não costumam chegar na favela. No caso das mulheres da Maré, a solução foi desenvolver outros meios de enfrentamento à violência.

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“Por um lado, nos impressionamos com a legislação progressista que vem sendo desenvolvida no Brasil. O Reino Unido ainda não ratificou o tratado de direitos humanos do Conselho da Europa contra a violência doméstica. Por outro, nossa pesquisa mostrou níveis extremamente altos de violência, principalmente entre parceiros, e a falha do sistema legal em proteger essas mulheres. No segundo estudo, nos surpreendemos e fomos inspirados pela força das mulheres com quem trabalhamos. Temos compartilhado suas histórias de dor, resistência e solidariedade além das fronteiras do país”, disse ao Globo Cathy Mcllwaine, pesquisadora da King’s College London.

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Quando questionadas sobre serviços de apoio e enfrentamento à violência de gênero, a maioria das mulheres entrevistadas afirmou não conhecer nenhum oferecido pela rede pública. As delegacias são percebidas pela maior parte delas como “violentas” e “ineficazes”. O acesso à Justiça é considerado raro, o que é entendido por elas como uma uma representação da desigualdade e mais uma forma de violência.

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No desenvolvimento local de uma cultura própria de proteção, os pesquisadores identificaram que as moradoras do complexo também desenvolvem estratégias de médio e longo prazo, como incentivos para o retorno aos estudos e ao mercado de trabalho, que podem vir a garantir maior autonomia financeira. No seio da própria comunidade, também foram criados projetos que incentivam o empreendedorismo e valorizam a história da Maré.

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