Turismo é a oportunidade do Rio sair crise

Com imagem positiva da Copa e da Olimpíada e planos consistentes, a cidade precisa resolver problemas, como a crise na segurança, para lucrar com o setor

Por Pedro Moraes
Atualizado em 27 Maio 2017, 00h00 - Publicado em 27 Maio 2017, 00h00
Turistas argentinos tiram fotos em frente ao Maracanã, fechado para visitantes: passeio frustrado (Felipe Fittipaldi/Veja Rio)
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Pontos Turisticos
Turistas argentinos tiram fotos em frente ao Maracanã, fechado para visitantes: passeio frustrado (Felipe Fittipaldi/Veja Rio)

A chuva fina e um enorme engarrafamento nas vias de acesso não foram empecilho para que um animado grupo tomasse a entrada principal do estádio do Maracanã na manhã da sexta-feira (19). Por volta das 10 horas, seis vans ocupadas por chilenos e argentinos e um ônibus lotado de japoneses descarregaram seus passageiros em frente à estátua de Bellini, para uma visita ao complexo esportivo que consumiu mais de 1 bilhão de reais nas reformas para a Copa de 2014 e os Jogos de 2016. A intenção dos turistas era conhecer o templo do futebol, admirar suas linhas dos anos 1950 e sua cobertura de lona sintética branca. O único senão: os portões estavam fechados. O maior e mais famoso estádio de futebol do país não recebe visitantes desde fevereiro do ano passado, quando foi entregue ao Comitê Rio 2016, e hoje é o centro de uma conturbada novela que definirá os novos responsáveis por sua gestão e utilização. A promessa é que será reaberto para visitas em junho. Entretanto, os estrangeiros que apareceram para dar um “olá” (parte deles vinda de Búzios) tiveram de se contentar com as explicações em portunhol de três vendedores ambulantes que ofereciam badulaques piratas ligados à Seleção Canarinho. O episódio ocorrido na Zona Norte do Rio resume com exatidão o que acontece hoje no setor de turismo da cidade. Com atrações de forte apelo, desperdiçamos a oportunidade de ganhar dinheiro por desorganização, falta de planejamento e amadorismo. A boa notícia é que há disposição para reverter tal situação. “Vivemos aqui um dos piores cenários do país, mas, ao mesmo tempo, temos a solução mais fácil e possível. A crise é o melhor momento para encontrar oportunidades, as pessoas estão abertas. Apostar na nossa vocação turística é nossa saída”, diz o empresário Roberto Medina, que promoverá em setembro mais uma edição do Rock in Rio, em Jacarepaguá.

QUADRO ABRE Economia
(Equipe/Veja Rio)

Publicitário de formação e entusiasmado defensor da cidade onde nasceu (não à toa a palavra Rio foi incorporada à marca de seu negócio mais exuberante), Roberto Medina faz parte do Conselho Municipal de Turismo. Dedicada a dar orientação e oferecer consultoria à prefeitura nesse segmento, a entidade reúne, além de Medina, o ex-diretor superintendente da TV Globo José Bonifácio de Oliveira Sobrinho, o Boni, o empresário Ricardo Amaral e o presidente da Associação Comercial do Rio, Paulo Protasio. Juntos, eles se propõem a indicar quais os passos que permitirão ao Rio projetar-se no setor de turismo e entretenimento. A primeira iniciativa deve ficar pronta em julho, batizada de Rio de Janeiro a Janeiro. Trata-se de um calendário oficial de eventos que contemplará grandes celebrações como o Carnaval e o réveillon, além de criar atrações capazes de atiçar a curiosidade de forasteiros nos outros meses do ano. A iniciativa coincidirá com uma ofensiva de marketing conduzida pela Riotur nas demais regiões do país e no exterior. Espera-se que as ações conjuntas elevem em até 20% o número de desembarques em solo carioca no primeiro ano. Estima-se que a receita anual proveniente dos gastos dos turistas seja de 16 bilhões de reais. O acréscimo significaria um aporte de mais 6 bilhões de reais, com a criação de quase 100 000 postos de trabalho, segundo estudo feito pela Fundação Getulio Vargas sob encomenda do conselho. A premissa para que tudo funcione como planejado é a injeção de 200 milhões de reais anuais na promoção da cidade, em paralelo com um plano de segurança pública específico para as áreas turísticas, avaliado em outros 25 milhões de reais por ano. “Estamos negociando com a prefeitura e com a iniciativa privada, por meio de patrocínios, a forma como acontecerá esse investimento. Mas estou confiante em que no máximo em um mês isso estará resolvido”, diz Marcelo Alves, presidente da Riotur.

Lapa
Arcos da Lapa, no Centro: alvo da operação de segurança nos pontos turísticos cariocas (Felipe Fittipaldi/Veja Rio)
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Se existe uma conjuntura de fatores que repelem viajantes, é a combinação explosiva de alta criminalidade com violência. Mais que epidemias, ameaças de desastres naturais ou pobreza endêmica, é o risco de perder a própria vida num ataque de bandidos (ou terrorista) o que mais apavora o turista médio. Nesse aspecto, o Rio, definitivamente, não vai bem. Com a falência da política de UPPs, a crise econômica que estrangula a atuação policial e o aumento dramático dos assaltos e roubos, a falta de segurança é o primeiro entrave a ser removido. Nesse embate, prevê-se uma ação em duas frentes. A primeira é um programa de policiamento de dezoito pontos turísticos, nos moldes do programa Segurança Presente (patrocinado pela Fecomércio em áreas como Lagoa, Centro e Flamengo), com agentes da Guarda Municipal, Polícia Militar, Polícia Civil, Secretaria de Conservação e Secretaria de Ação Social. A segunda abrange um plano que ainda está sendo traçado com o Ministério da Defesa e envolve a atuação da Força Nacional na cidade. “Fora do Brasil a imagem do Rio está excelente. Sou francês e posso dizer que, com a Copa e os Jogos Olímpicos, as qualidades da cidade poucas vezes foram tão valorizadas lá fora”, diz Patrick Mendes, presidente da rede francesa AccorHotels, dona de 32 unidades no Estado do Rio, 24 delas abertas nos últimos cinco anos, depois de consumirem investimentos de 2 bilhões de reais. “O problema é com os turistas brasileiros, que ocupam 70% dos nossos quartos e estão com medo de vir para cá. Temos de mostrar a eles que vir ao Rio é bacana e é seguro”, explica.

Reproduzir a conjunção de eventos que aconteceram nos últimos cinco anos é impossível. Entretanto, a cidade herdou uma infraestrutura altamente competitiva para receber visitantes. Em menos de uma década, o Rio ganhou uma injeção de 25 bilhões de reais a pretexto de preparar-se para a Olimpíada e conta com uma nova rede de BRTs, linha do metrô até a Barra, aeroporto internacional em padrões aceitáveis e rede hoteleira que passou de 30 000 para 57 000 quartos. Imaginava-se que a visibilidade alavancasse naturalmente o interesse pela cidade. Um equívoco grave. Sem planos consistentes para sustentar o interesse global, o projeto de tornar o Rio um paraíso turístico ruiu em meio à crise que atingiu a metrópole em cheio. Agora, tenta-se capitalizar o máximo possível o que restou desse passado coruscante. O Rio Convention & Visitors Bureau aposta no turismo de negócios para aquecer o setor. Entre 2017 e 2024, 153 eventos devem trazer à cidade quase 1 milhão de visitantes e injetar na economia local cerca de 4 bilhões de reais. “Em Las Vegas, 70% da ocupação dos hotéis é garantida por eventos, feiras e congressos. Com a rede hoteleira mais moderna do país, podemos seguir esse caminho”, defende Alfredo Lopes, presidente da Associação Brasileira da Indústria de Hotéis no estado.

Uma vez reunidas as condições para sediar grandes eventos, é preciso cuidar de detalhes com impacto direto na experiência dos visitantes. A sinalização e informações sobre pontos turísticos precisam ser revistas, assim como a qualidade do atendimento. O estilo de receber caloroso do carioca é um ponto positivo, mas não é suficiente em um mercado cada vez mais competitivo e disputado. É crescente o número de países e cidades que elegem o turismo como uma saída para superar crises. Em Israel, a guerra na Faixa de Gaza obrigou o governo a contratar consultorias internacionais para mudar a imagem do país. Na Colômbia, uma política de segurança pública consistente teve papel decisivo no aumento do número de visitantes. Em Portugal, um vigoroso projeto de fortalecimento do setor pôs o país na posição de um dos mais cobiçados destinos da Europa. E na Grécia incentivos fiscais garantiram maior competitividade ao setor hoteleiro. Ou seja, o que não falta ao Rio são boas ideias — amadurecidas aqui mesmo ou no exterior. Agora é preciso que o governo e a iniciativa privada as ponham em prática.

Quadro
(Equipe/Veja Rio)
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