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Beco do Becoza

Por Juarez Becoza, repórter de gastronomia popular e caçador de botequins Materia seguir SEGUIR Seguindo Materia SEGUINDO

Armazém Cardosão: um clássico em metamorfose

Bar que é um pedacinho de subúrbio no coração da Zona Sul se revitalizou durante a pandemia, sem perder o tradicional charme bucólico e musical

Por Juarez Becoza
Atualizado em 23 fev 2021, 18h12 - Publicado em 23 fev 2021, 14h37
Detalhe da fachada
Fachada antiga: tradição será renovada (Juarez Becoza/Arquivo pessoal)
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Caro leitor:

A penúltima vez em que visitei este patrimônio cultural, etílico e gastronômico do Rio, o Armazém Cardosão mantinha quase a mesma cara que tinha quando minha mãe o conheceu, ainda nos tempos de meninice dela, quando ia comprar doces enquanto vovó barganhava uns secos e molhados a granel, lá pelos anos 50 do século passado. Foi em 2019, poucos meses antes desse nosso caótico mundo contemporâneo – do qual o Cardosão era raro refúgio – virar de pernas para o ar.

Ontem, ao revisitar a casa pela primeira vez em 15 meses, não me frustrou nem um pouco constatar as mudanças que os corajosos novos donos do Armazém estão aos poucos implantando no lugar, numa lenta e cuidadosa metamorfose. Não vi mais a aparência de simpática porém caótica mercearia, entulhada de freezers e estantes carregadas de extrato de tomate, ovos, latas de sardinha, vinagre e azeite. Não que eu não gostasse dessa visão de outrora, dos tempos em que o Cardosão era de fato um armazém. Mas no cenário cruel que vivemos hoje, em que bares tradicionais fecham as portas a granel e no atacado, é um colírio ver essa injeção de novos ares na velha casa que sempre foi um pedacinho de subúrbio no coração da Zona Sul. E que mesmo assim não perdeu um pingo do velho charme. Pelo contrário.

O Armazém Cardosão se renova lentamente, para se perpetuar
O Armazém Cardosão se renova lentamente, para se perpetuar (Juarez Becoza/Arquivo pessoal)

Pra começar a Valéria, patrimônio do antigo Cardosão, segue recebendo os cliente na simpatia e eficiência de sempre, agora na companhia dos novos sócios Rodrigo e Guilherme, experientes empresários do universo da noite e da boemia carioca, e da médica e cozinheira Carol. As refrescantes mesas espalhadas nas calçadas das ruas Cardoso Júnior e Aparício Borges continuam lá, agora até com o conforto extra de ombrelones novinhos em folha. Lá no quintal de trás, a amada amendoeira que costumava abrigar com sua sombra generosa as épicas rodas de samba do Cardosão segue firme e linda, à espera do dia em que será possível sambar na rua novamente. E a feijoada, magra ou completa, para um ou para dois, segue firme no cardápio do fim de semana, não perdeu nem um fiapo de sabor e agora ainda pode ser pedida em casa: por causa da pandemia, o Cardosão também implementou seu serviço de delivery.

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Lá dentro, contudo, a mudança em andamento pode até chocar o saudosista num primeiro momento. Mas mesmo isso está sendo feito com carinho e respeito. O salão, esvaziado do mobiliário tradicional, se prepara para receber muito mais mesas do que antes – assim que a imunização permitir. Por enquanto, o espaço é de sobra, permitindo até que um trio de instrumentistas de jazz se reúna toda terça-feira (hoje tem!) para uma folgada jam session, das 18h às 21h. Eles trocam sossegados e em segurança lá dentro, e  a turma curte sossegada e em segurança cá fora, distanciados e de máscara, sob a brisa do alto da colina.

Em 3D, um estudo de como ficará o bar
Em 3D: um estudo de como ficará o bar (Armazém Cardosão/Divulgação)

E nessa mexida no salão, Rodrigo e Guilherme descascaram um tesouro: a parede original da casa de tijolos antiquíssimos, que aos poucos eles vão expondo para se tornarem parte integrante do lugar.

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Pequenos esforços, feitos para acompanhar o zeit geist do momento, que incluem também o serviço de delivery, que o Cardosão nunca havia oferecido, e que agora funciona a todo vapor desde o começo da pandemia. Mas sem matar o velho espírito dos tempos das mercearias. Para poder manter vivo o bar e o DNA de boemia, música, cultura e democracia que sempre o marcou.

Afinal, é bom que se registre, o nome do armazém não se deve ao digníssimo tenente-coronel Francisco José Cardoso Júnior, membro da mais alta cúpula militar do imperador Pedro II. Mas, apenas e tão somente, ao bloco carnavalesco do Cardosão, que há décadas se concentra ali, na quadra logo atrás do bar, para vasar de alegria ladeira abaixo toda terça-feira Gorda. Esse ano não teve, mas ano que vem será em dobro. Em triplo. Oxalá com o velho bar inteiramente renovado, vacinado – e lotado.

Armazém Cardosão (@armazemcardosao)
facebook.com/armazemcardosaoltda
Rua Cardoso Júnior, 312, Laranjeiras
De terça a quinta, das 17h às 22h
Sexta, das 17h às 23h
Sábado, sábado, de 12h30 às 23h
Domingo, de 12h30 às 22h
Delivery: Ifood, Mesa Local e Whatsapp: (21) 96491-7924

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