Belo momento para o streaming brasileiro
No Rio2C, palestras da Netflix e Globoplay confirmam alto investimento em produções nacionais
A Netflix que me desculpe, mas eu vou contar sim sobre o que foi falado na palestra deles no Rio2C. Onde já se viu isso? Os caras reúnem centenas de pessoas na maior sala, do maior evento de entretenimento e negócios do Rio de Janeiro, fazem um painel fantástico gerando mil conversas, e dizem que a gente não pode fotografar e nem falar sobre o que rolou? Ah, Netflix! Me poupe. Aliás, ótima essa estratégia low profile para todo mundo falar de vocês, hein? 🙂 Brincadeiras à parte, deixa eu contar sobre essa palestra que assisti no evento, que acabou no último domingo, lá na Cidade das Artes.
Primeiro vale dizer que foi uma mesa de umas duas horas só com mulheres em cargos de liderança, brancas e pretas, e apenas um homem no front criativo da empresa, o que, de cara, já me agradou pela diversidade e alinhamento ao zeitgeist. A Netflix está fazendo dez anos de operação no Brasil comemorando um bilhão e meio de reais investidos em produções brasileiras e o papo trouxe informações importantes para o trade de entretenimento que foram desde o fato de que ninguém precisa submeter um roteiro inteiro para avaliação (mas sim um argumento), passando por detalhes operacionais interessantes sobre o desafio de “abrasileirar” um reality show e indo até os interesses da empresa no mercado de dublagem.
Em uma mesa, especificamente, eles reuniram três autores de produções que fizeram muito sucesso: Julia Rezende, de Todo Dia A Mesma Noite, Juliana Vicente, de Racionais: Das Ruas de São Paulo pro Mundo e Diego Freitas, de Depois do Universo. Questionados sobre a “fórmula do sucesso”, os três concordaram em um ponto: originalidade e respeito ao tema. Fato que casou perfeitamente com uma máxima repetida pela Netflix algumas vezes durante o evento: a empresa diz não ter pressa para esperar o melhor formato possível para filmar. Eles querem o melhor elenco, no melhor momento, ainda que para esse alinhamento dos astros pode ser que demorem alguns anos. Propósito que a diretora Juliana pôde comprovar, por exemplo, considerando que demorou sete anos para filmar o documentário, engravidou, pariu e, pouco antes do filme ser lançado, sua filha era embalada ao som do Racionais de tanto que a música era íntima para ela.
Bom ver esse mercado superaquecido. A palestra da Globoplay que aconteceu um pouco depois nesse mesmo dia confirmou a tendência de alta. Desde que o streaming da TV Globo foi lançado, em 2015, só no segmento de documentários foram 42 produções nacionais. O foco nesse mercado audiovisual on demand é tão grande que a frase de efeito atual do streaming é “Do Plim ao Play” fazendo alusão ao inesquecível “Plim Plim”, vinheta criada em 1971 por Mauro Borjalo e que havia sido encomendada pelo Boni, diretor da emissora na época. Ele havia pedido algo que pudesse ser ouvido a quadras de distância e que fizesse a família voltar para a frente da TV. Muito interessante como tudo mudou desde então, né?
O que era uma espécie de companhia para as pessoas – a televisão – virou apenas uma das opções onde a programação escolhida pode ser assistida pela audiência. Lembrando que agora também essa mesma audiência vê o que, quando e onde quer. Mas voltando às apalestras, apesar do desfile de celebridades globais, que variou de Ivete Sangalo a Tony Ramos, cada um com uma fala de minutos para fazer o teaser do seu programa em questão; para mim, valeu também a certeza que o streaming nacional vive um bom momento não só comercialmente, como também editorialmente. Amei saber, por exemplo, que entre as histórias contadas pela Globoplay muito em breve teremos grandes nomes da cultura nacional como Raul Seixas, Xuxa e Betinho entre os perfilados. Quem ganha é o telespectador.
Carla Knoplech é diretora da agência Forrest, idealizadora do Levanta Botafogo, professora no Método Pipa e consultora no Instituto Gênesis PUC-Rio.