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Fabiane Pereira

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Cara gente branca

A premiada peça-denúncia de Clayton Nascimento é imperdível

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Atualizado em 8 Maio 2023, 18h34 - Publicado em 8 Maio 2023, 14h18
Clayton Nascimento em cena - Macacos
 (Julieta Bacchin/Divulgação)
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MA-CA-COS. MA-CA-COS. MA-CA-COS. Macacos, substantivo masculino no plural. Palavra de origem africana utilizada para designar os símios ou primatas. Aplicado no Brasil para um grupo dos cebídeos. Tipo de mamífero primata que vive no coletivo. Jamais deve ser aplicada aos seres humanos. É um dos xingamentos mais populares do mundo.

É assim – forte, direto e impactante – que começa o espetáculo escrito por Clayton Nascimento, um “piaulistano” (nascido em São Paulo, filho de pais nascidos no Piauí) de 34 anos, que após cinco tentativas, foi aprovado para a turma de teatro da USP. E após tentar oito vezes, foi aprovado no EAD (Escola de Artes Dramáticas da USP).  “Macacos” é um monólogo de mais de duas horas que foca na ferida histórica do trauma colonial brasileiro e coloca em cena as dolorosas experiências com o racismo vivenciadas por Clayton e por muitos pretos nascidos nas periferias desse país, cujo nome vem de uma árvore explorada ao máximo na primeira atividade econômica exercida pelos portugueses nessa terra.

É o próprio Clayton quem hipnotiza a plateia por um bom par de horas ininterruptas. O ator, cuja musculatura corporal também impressiona, sua, esbraveja, brinca, emociona, cospe, dança e homenageia Elza Soares, Bessie Smith e Machado de Assis. Ele resgata a memória de pessoas vítimas do genocídio negro, como o menino Eduardo, morto aos 10 anos no Complexo da Maré, em 2015. A maternidade solo, tão comum nessa mátria nada gentil, também está presente. No palco, junto com Clayton, apenas uma excelente iluminação e um batom vermelho que se transforma em giz no quadro negro de seu corpo.

Clayton Nascimento em cena - Macacos
(Julieta Bacchin/Divulgação)

O preconceito secular contra os povos pretos é o mote do espetáculo que se desenrola em um fluxo intenso de pensamentos, desabafos e elucidações. Ao contrário de Clayton que se descobriu preto ainda criança, eu só me dei conta disso há cinco anos, já com quase 40. Num país que só descobriu que um de seus mais ilustres escritores era preto há dez anos, o racismo precisa ser debatido em todos os espaços, públicos e privados, para que possamos nos livrar desse mal.

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A peça de Clayton é urgente e generosa. Nenhum pacto da branquitude sobrevive após vê-lo no palco. NÃO DEVERIA SOBREVIVER. Clayton é o quarto ator negro a ganhar o prestigiado Prêmio Shell de Teatro, criado em 1988. Outros prêmios virão e eu espero estar sempre na plateia aplaudindo esse gigante.

++

As próximas sessões no Teatro Ipanema já estão esgotadas. Espero que a casa consiga outras datas para que esse ator continue sendo aplaudido de pé e constrangendo a branquitude.

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