Resolução do CFM é marco histórico para segurança do médico
CFM aprova resolução histórica que reforça segurança e proteção aos médicos nos locais de trabalho.
							Dr. Fabiano M. Serfaty: A medicina é uma das profissões mais nobres, mas também uma das mais desafiadoras, sobretudo no Brasil, onde médicos muitas vezes arriscam a própria vida para salvar outras. A violência crescente nas unidades de saúde, somada à negligência de gestores em adotar medidas eficazes de proteção, transformou o ambiente de trabalho em um campo de risco. Nesse contexto, o Conselho Federal de Medicina (CFM) aprovou uma resolução inédita que estabelece diretrizes claras para garantir a segurança dos profissionais. Trata-se de um marco histórico, não apenas para os médicos, mas para todos que acreditam que cuidar da saúde deve ser um ato protegido, digno e respeitado.
Para compreender melhor os objetivos e impactos dessa resolução, conversamos com Dr. Raphael Câmara, conselheiro federal de Medicina pelo Rio de Janeiro e relator da proposta, que detalhou os pontos centrais e reforçou a importância da medida. O que levou à necessidade da publicação dessa resolução e por que você foi o relator?
Dr. Raphael Câmara: O cenário de caos com os médicos sendo agredidos diariamente nas unidades de saúde com total apatia dos gestores em resolver o problema nos obrigou a termos de agir. O Conselho Federal de Medicina (CFM) é hoje o último baluarte na defesa da medicina e do médico num momento tão hostil a nós. A escolha do meu nome se deveu a eu ter proposto a resolução e pelo Rio de Janeiro ser um dos locais mais violentos para o exercício da medicina, sendo os médicos inclusive vítimas de tiros de fuzil no local de trabalho como aconteceu lamentavelmente com nossa colega médica no hospital naval. A resolução obriga à blindagem de paredes em locais com alta incidência de balas perdidas. Mas importante frisar que foi aprovada por todos os conselheiros e recebeu importantes contribuições do plenário.
Dr. Fabiano M. Serfaty: Em resumo, o que prevê a resolução?
Dr. Raphael Câmara: As unidades de saúde devem ter controle de acesso, videomonitoramento em áreas comuns e protocolos de resposta imediata a situações de violência. Essas medidas de segurança estão previstas na Resolução CFM nº 2.444/25, que também obriga o diretor técnico a notificar agressões sofridas por médicos ao Conselho Regional de Medicina (CRM), à autoridade policial e ao Ministério Público.
De acordo com levantamento feito pelo CFM, 12 médicos são agredidos diariamente em seus locais de trabalho. Também estabelece que a unidade de saúde deve dar suporte psicológico e jurídico ao médico agredido e a possibilidade de o profissional solicitar transferência de setor e deverá notificar ao CRM os casos de violência contra médicos ocorridos em suas dependências, orientar os profissionais sobre as providências cabíveis após a agressão e prestar apoio administrativo, inclusive para registro policial, assistência psicológica, social e médica. As unidades de saúde também deverão ter estacionamentos seguros e devidamente sinalizados para médicos, acessos independentes para entrada de profissionais, repouso médico com controle de acesso por biometria, rotas de fuga e espaços de refúgio e protocolos de resposta rápida, com códigos internos e botão de pânico. Locais que desobedeçam as normas de segurança previstas em resoluções do CFM poderão sofrer interdição ética em que médicos estarão proibidos de trabalharem na unidade. Nos estabelecimentos localizados em áreas de risco, o diretor técnico também deve implementar medidas adicionais de segurança, como salas seguras e protocolos de paralisação de atividades em casos de confrontos armados nas proximidades da unidade de saúde. Em relação a esses locais, a norma estabelece que os CRMs deverão mapear as unidades com alta incidência de violência contra médicos para subsidiar políticas públicas e propostas legislativas nos âmbitos municipal, estadual e federal.
Dr. Fabiano M. Serfaty: Existem outras ações na resolução?
Dr. Raphael Câmara:É muito comum o médico ser agredido e a segurança ficar assistindo sem nada fazer relatando serem somente patrimonial. Isso acabou! Os contratos agora terão de prever a segurança física dos médicos e dos outros profissionais de saúde e pacientes. Essa resolução protege a todos. Nós do CFM nos preocupamos com a segurança de todos os profissionais de saúde e da população. O médico terá de ter a mesma segurança que prefeitos e secretários de saúde têm! Se eles gastam com segurança para eles, devem também disponibilizar para os médicos já que sem médico não há saúde. Que não venham dizer que não têm orçamento para isso!
Dr. Fabiano M. Serfaty: A resolução também obriga que a unidade de saúde disponibilize profissional de saúde do mesmo gênero do paciente para atendimentos?
Dr. Raphael Câmara: Sim. Muitas vezes, temos denúncias de pacientes em que fica a palavra do médico contra a do paciente e, quando a denúncia é falsa, pode destruir a carreira do médico. O paciente já tem diversas leis para o proteger. Faltava uma ação para proteger o médico. Entendemos que protege o médico e o paciente.
Dr. Fabiano M. Serfaty: A resolução tem alguma atitude contra a invasão de parlamentares em unidades de saúde invadindo salas vermelhas e locais de descanso dos médicos em nome de uma suposta fiscalização?
Dr. Raphael Câmara:Essa é uma das principais ações. Acabou isso! Quem invadir salas de emergência e descanso sem autorização do diretor médico poderá sair até preso da unidade. Terá obrigação o diretor médico de chamar a polícia e tomar todas as atitudes cabíveis contra essas invasões midiáticas que inclusive provocaram uma morte em Minas Gerais. Era hora de dar um freio nisso. Quem quiser aparecer que coloque uma melancia na cabeça. O CFM não aceita palhaçada contra os médicos. A forma de fazer denúncia caso haja algo errado é com seriedade e não com pirotecnismo. O descanso médico é previsto em legislação própria. Essa prática se iniciou no Rio com um vereador que acabou perdendo o mandato e foi condenado por estupro e depois se espalhou pelo Brasil em busca de likes.
Dr. Fabiano M. Serfaty: Alguma nova ação podemos esperar do CFM?
Dr. Raphael Câmara: Muita coisa. O CFM não para em defesa da medicina, dos médicos, da saúde e da população. Nosso foco principal é a aprovação do projeto de lei da proficiência médica nos moldes do exame da OAB para impedir pessoas com péssima formação de prejudicarem a população. Pesquisa no Datafolha mostrou que 96% da população apoia. Quem colocar em risco a população não pode ser médico. O que ele vai fazer com o diploma e com o dinheiro que ele gastou em seis anos caso não passe no exame é problema dele e não da população. O CFM completou agora 80 anos e temos certeza que nunca na história ele foi tão importante em seu papel da defesa da medicina. Nunca ela foi tão atacada. Mas isso só nos fortalece! E esperamos contar com o apoio da população para que o médico volte a ser tratado com o respeito que merece por sua função tão nobre de salvar vidas.