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Fábio Barbirato

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Psiquiatra infantil

“Travessia” expõe o drama de famílias com jovens dependentes em games

Novela retrata o quanto a adição em jogos pode desestruturar a dinâmica familiar

Por Fabio Barbirato
13 mar 2023, 11h22
O ator Ricardo Silva no papel do personagem Theo.
Cena da novela "Travessia": o jovem Theo (Ricardo Silva) acaba de distanciando da família e dos amigos, focado exclusivamente nos jogos eletrônicos.  (TV Globo/Divulgação/Reprodução)
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Uma das mais poderosas e eficientes formas de reflexão na sociedade brasileira é a novela. Mesmo com a diminuição da audiência nos últimos anos, a telenovela ainda atinge milhões de lares, especialmente entre as classes mais baixas, abrindo a possibilidade de diálogo com um público que não teria esse espaço tão facilmente. Para nós, profissionais de saúde, é muito interessante quando a teledramaturgia é capaz de retratar situações que encontramos frequentemente em consultórios psiquiátricos, como os diferentes tipos de dependência.

Se as novelas já tinham abordado, com bastante frequência, a dependência por álcool e drogas, em “Travessia”, de Gloria Perez, é a primeira vez que o horário nobre se debruça sobre uma das adições crescentes na contemporaneidade: o vício em jogos eletrônicos. Na trama, o jovem Theo (Ricardo Silva) acaba de distanciando da família e dos amigos, focado exclusivamente nos jogos eletrônicos. A compulsão abala não apenas a vida do rapaz, mas a autoestima da irmã Isa (Duda Santos), que se sente relegada a segundo plano, e também o casamento dos pais Monteiro (Aílton Graça) e Laís (Indira Nascimento), que passam a brigar com frequência sobre o comportamento do filho.

Há um ano, desde março de 2022, a Organização Mundial de Saúde (OMS) reconhece a dependência em jogos eletrônicos como uma doença. De acordo com o Grupo de Dependências Tecnológicas do Programa Integrado dos Transtornos do Impulso, ligado ao Instituto de Psiquiatria da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP), a média mundial de dependência tecnológica, que inclui internet a jogos eletrônicos, gira em torno de 10% dos usuários. A dependência em jogo libera dopamina no cérebro, produzindo a sensação de euforia, bem-estar e satisfação, assim como as drogas ou o álcool.

O novo patamar é interessante porque até bem poucos anos, videogames eram entendidos apenas como um passatempo despretensioso. Na última década, virou profissão profícua para muitos jovens que disputam campeonatos online, comparável ao futebol nas cifras milionárias que envolve. Diante dessa nova dinâmica, as fronteiras entre o que é hobby, o que é trabalho e o que é dependência ficaram borradas.  

Pais e responsáveis já andam bastante confusos com o tempo que crianças e jovens devem passar diante de telas, como tablet e celular, consumindo conteúdo online. Diversos estudos já apresentaram conclusões sobre o impacto das telas na saúde mental das crianças e adolescentes. Alguns especialistas estrangeiros, mais radicais, defendem a abstenção total até os seis anos de idade.

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A Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) tem suas recomendações sobre o tempo e a idade que as crianças devem ser expostas a telas: até uma hora por dia para crianças com idade entre 2 e 5 anos, e duas horas, como o limite máximo, para crianças com idade entre 6 e 10 anos. Já para os adolescentes, com idades entre 11 e 18 anos, a indicação é de, no máximo, 3 horas por dia, incluindo o uso de videogames.

Pesquisa francesa recente apontou que jovens passam mais de sete horas por dia em gadgets para uso recreativo e apenas uma hora com finalidade educacional. Alguns estudos indicam alterações significativas no desenvolvimento cerebral de crianças com grande número de horas diante de telas. Esse controle, no entanto, fica mais difícil na medida em que é preciso reconhecer que as novas gerações são nativas digitais: é também no ambiente online, e não apenas no presencial, que os jovens se reconhecem e socializam.

É importante frisar que nem tudo é negativo no que se refere à vida digital. Ao contrário! Conteúdos audiovisuais, como séries, programas e filmes podem ser excelente fonte de cultura e educação, além de entretenimento.

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Mas então, como saber que as horas online passaram do recomendável? A melhor medida é notar quando o tempo conectado traz prejuízo às outras áreas da vida da criança ou do jovem. Se ele se isola, não demonstra nenhum interesse pelo estudo, trabalho ou por outros tipos de diversão, e até mesmo negligencia atividades caseiras simples, como se alimentar ou tomar banho, é sinal de alerta. Procure ajuda de um profissional especializado, ele saberá como ajudar seu filho.

Fabio Barbirato é psiquiatra pela ABP/CFM e responsável pelo Setor de Psiquiatria Infantil do Serviço de Psiquiatria da Santa Casa do Rio. Como professor, dá aulas na pós-graduação em Medicina e Psicologia da PUC-Rio. É autor dos livros “A mente do seu filho” e “O menino que nunca sorriu & outras histórias”. Foi um dos apresentadores do quadro “Eu amo quem sou”, sobre bullying, no “Fantástico” (TV Globo).

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