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Manoel Carlos

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Blog do novelista Manoel Carlos

Mosaico

Que rei sou eu? O velho Chico Viola, o rei da voz Francisco Alves, já sabia que a coroa real era de lata e que a memória não se transfere de uma geração a outra. Rei ontem, anônimo hoje. Esta semana, precisamente o dia 27, marcou o sexagésimo aniversário da morte do cantor num desastre […]

Por vejario
Atualizado em 25 fev 2017, 19h19 - Publicado em 29 set 2012, 01h01

Que rei sou eu?

O velho Chico Viola, o rei da voz Francisco Alves, já sabia que a coroa real era de lata e que a memória não se transfere de uma geração a outra. Rei ontem, anônimo hoje. Esta semana, precisamente o dia 27, marcou o sexagésimo aniversário da morte do cantor num desastre na Via Dutra. Seu enterro foi consagrador como sua vida. Quem sempre conseguiu reunir milhares de admiradores em praça pública foi levado ao São João Batista por milhares de órfãos da sua bela e potente voz. Eu o vi cantando, arrebatador, no Largo da Concórdia, em São Paulo. Vendo-o sobre um palco, aplaudido entre lágrimas por homens e mulheres, não se podia evitar a emoção.

Voz de cantor de opereta, como a de Vicente Celestino, o avesso do refinado Mário Reis, com quem gravou em dueto. Mais tarde, todos eles foram superados pelo incomparável Orlando Silva, o verdadeiro “cantor das multidões”. De nenhum deles se ouve mais uma única nota musical. Nem no rádio nem na televisão. Um dos maiores sucessos de Chico Alves, lançado no Carnaval de 1945, quando ele já era chamado de “o rei da voz”, ironizava uma coroa real com os versos:

Que rei sou eu
Sem reinado e sem coroa
Sem castelo e sem rainha
Afinal que rei sou eu?

***

Felicidade

O canal Viva reprisa, desde segunda-feira, uma novela que escrevi em 1991, Felicidade, que marcou, entre muitos eventos, a estreia de Vivianne Pasmanter na TV, ao lado do Tony e da Maitê, em interpretações memoráveis. Revi o primeiro capítulo, emocionado com tantas presenças queridas, muitas delas já desaparecidas do mundo dos vivos, como Cláudia Magno, Yara Cortes, Marly Bueno, Serafim Gonzalez, Ariclê Perez, Benjamin Cattan, Castro Gonzaga, Miguel Magno, Paulo Pinheiro e Sandra Bréa, que faz na novela sua última aparição na TV. Felicidade marca também a estreia de Denise Sarraceni como diretora-geral de uma novela, mostrando, desde então, seu talento para comandar uma grande equipe. Essas reprises do canal Viva nos levam a uma saudável lembrança de acontecimentos da vida pessoal de cada um de nós. Por exemplo: em 1991, quando a novela estreou, em outubro, minha mulher estava grávida do nosso filho Pedro, que nasceu em dezembro daquele ano e, portanto, caminha para seus 21 anos dentro de dois meses. Saudade de Felicidade, um trabalho que eu fiz com a Elizabeth Jhin, o Marcus Toledo e a Eliane Garcia.

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Tatuagem

A crônica que deixei neste espaço há duas semanas rendeu alguns comentários de leitores que encontrei nas minhas andanças pelas ruas do Leblon. O mais curioso deles foi de uma jovem que exibiu para mim e para minha mulher, na fila da pipoca do cinema, a frase “Tô carente” tatuada na nuca. Minha mulher sorriu, complacente, e eu fiz uma observação óbvia e tolamente paternal:

— Não acha que essa confissão te expõe muito?

— Claro que sim — disse a jovem. — Deixa eu te contar o melhor dessa história. Há dois anos, numa festa, mostrei a tatuagem para um rapaz, que imediatamente mostrou a dele, no peito: “Te pego no colo, neném”.

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E riu com as amigas que a acompanhavam.

— Nossa, que coincidência! — disse eu. — Parece cena de novela.

— E olha: dei sorte. Ele me pega no colo até hoje!

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***

50 Tons de Cinza

Não li o romance, ou melhor: não li de carreirinha, como o Zeca Diabo de O Bem-Amado, do Dias Gomes. Li saltando algumas páginas, como faço sempre que leio um livro por dever, já que está muito comentado por causa de um grande sucesso, e não por escolha espontânea, quando perseguimos um autor e tudo o que ele escreve. Ou por interesse pelo tema que sabemos estar sendo abordado naquela obra. Mas enfim… Não posso dizer que li, mas também que não li. Li mais ou menos. Não achei mal escrito nem pouco merecedor da colossal vendagem. Também ficou claro que os homens correram atrás do livro, tanto quanto as mulheres. Só que de maneira envergonhada. E desdenhosa. O livro incomodou e fez alguma sombra nas relações íntimas de alguns casais. Uma desconfiança. Vendo o interesse da mulher, que não consegue deixar o livro um minuto sequer, muitos maridos devem pensar: “Será que ela espera o mesmo de mim? Que vai começar agora a procurar por um Christian Grey, acreditando ser uma Anastásia Steele ainda não revelada, mas que finalmente encontrou como modelo?”.

Uma dúvida dessas gera insegurança e pode acabar com uma relação até então calma, conformada e, por que não dizer, hipócrita.

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