Dia de final
Vou confessar num fôlego só: não tive a menor paciência para a Copa das Confederações desde que ela começou. Podem me chamar de louca, mas é tanto trabalho e tanta coisa rolando na minha cabeça que a bola rolando em campo (e todo o frisson em torno do assunto) não me causava nenhum interesse. Copa […]
Vou confessar num fôlego só: não tive a menor paciência para a Copa das Confederações desde que ela começou. Podem me chamar de louca, mas é tanto trabalho e tanta coisa rolando na minha cabeça que a bola rolando em campo (e todo o frisson em torno do assunto) não me causava nenhum interesse. Copa das Confederações? Eu nunca tinha nem ouvido falar disso! Se ainda fosse a do Mundo, tudo bem, mas das Confederações… Não. Preferi trabalhar durante os jogos. Ou ouvir música.
Para dar uma noção exata do meu desprendimento futebolístico em relação a essa copa, assim que a final entre Brasil e Espanha começou fui para o quarto com os fones do meu ipod no ouvido. Levei um susto quando o Cao entrou -– dois minutos depois! — para avisar que o Fred tinha feito um gol deitado. Fiquei curiosa e corri para a sala para ver o replay. De lá não saí, embora meus olhos estivessem vidrados não na tela da tevê, mas na do iPad. Resolvi conversar com o Google sobre Lucrécia Bórgia.
– Cao, é uma pena que você não esteja vendo The Borgias, sabia? Uma das melhores séries que já vi. O quinto episódio da primeira temporada foi incrível. Você acredita que o Papa…
– Amor! AMORRR!!! É sério isso? Tá louca? Shhh! – reagiu fofamente meu marido.
Entendi o nada sutil recado e calei a boca.
Com um olho na tevê e outro na Wikipédia, vi o David Luiz arrasando, o gol elegantésimo do Neymar e o principal, pude finalmente observar atentamente a bunda do Hulk. Além disso, teci comentários sobre algumas chuteiras (só eu implico com as de cores berrantes, meu Deus?) e questionei o corte da maioria dos jogadores em campo.
– Que cabelo é esse, Cao? Esse cara não tem mãe? Namorada? Espelho?
– Shhh!
– Tudo bem, se ele tá feliz assim, isso que importa, né?
Depois dessa nem “Shh!” eu ganhei. Apenas um olhar para lá de revoltado com minha tagarelice fora de hora.
Brasil 2, Espanha 0. Intervalo. Chamada do Fantástico no ar mostrou o que íamos ver no Show da Vida: os preparativos para o casamento de Naldo. Eu, como toda leitora de site de fofocas, sei que a boda vai ser nababesca. Enquanto penso “, nossa, como sou bem informada”, entra a sonora da noiva do funkeiro falando sobre caviar. Cao pergunta:
– Quem é essa mulher?!
– A mulher do Naldo!
– Quem é ela?
– A Mulher Moranguinho! Caramba!
Que cara sem cultura!, quase emendei. Mas achei que ele podia magoar. Cao não tem a menor intimidade com o mundo das subcelebridades. Outro dia fiquei chocada quando ele contou que não sabia que a irmã do Neymar anda por aí de lentes azuis nem que a filha do Renato Gaúcho (ou seria do Bebeto? Ou a do Romário?) tinha tirado foto de short curtinho. Como pode uma pessoa tão interessada em futebol com tanto desinteresse em notícias sobre futebol?
Aos 11 minutos do segundo tempo, Brasil 3 (gol do meu Fred), Espanha 0, perguntei:
– O que vamos fazer agora? – resolvi implicar.
– Terminar de ver o jogo.
– Mas ainda faltam 34 minutos! – insisti na implicância. – E já está três a zero. Ganhamos. Pronto, acabou! Cabô!
Mais uma vez fiquei no vácuo. O meu dileto marido realmente não estava a fim de conversa.
Depois do apito final, achei que a vida ia voltar ao normal.
– Vamos sair pra jantar?
– Só depois da entrega da taça.
Puuutz!, resmunguei em pensamento. E continuei a resmungar quando percebi que antes da taça ainda seria obrigada a ver a entrega das chuteiras de bronze, de prata e de ouro, das bolas de bronze, de prata e de ouro e da luva de ouro. Ufa! Esqueceram as luvas de bronze e de prata. Que sorte a minha!
Ok, confesso que achei bonita a emoção de Felipão e companhia ao receber as medalhas e a taça. E que me encantei com o carisma e a garra da nossa seleção. Mas a imagem da Copa das Confederações que vai ficar na minha memória é outra, que se repetiu em várias partidas: jogadores e arquibancadas lotadas cantando em uníssono, a plenos pulmões, o hino nacional — mesmo depois que a melodia parava de tocar. Sensacional. Viva o Brasil!
Podemos jantar agora?