Leniel Borel, pai do menino Henry: “Mães também matam”
O atual vereador fala sobre a estreia da série documental que narra o caso do brutal assassinato de seu filho, primeira produção do canal Veja+

No dia 8 de março de 2021, Henry Borel, de apenas 4 anos, foi levado ao hospital pela mãe, Monique Medeiros, e o padrasto, o médico e vereador conhecido como Doutor Jairinho. Ambos alegavam tê-lo encontrado desmaiado no quarto onde dormia, em um apartamento na Barra. Não demorou muito para que a investigação, ao descobrir 23 lesões no menino, incluindo laceração no fígado, danos nos rins e hemorragia na cabeça, afastasse a hipótese de acidente. Um mês depois, o casal foi preso de forma preventiva por suspeita de homicídio duplamente qualificado, com emprego de tortura e sem chance de defesa para a vítima.
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A trama macabra que chocou o Brasil chega agora à televisão, com revelações inéditas e depoimentos emocionantes de mais de vinte personagens desta história. Produzida por VEJA, com roteiro de Monica Weinberg e Ricardo Ferraz, a série documental Caso Henry Borel — A Marca da Maldade ganha as telas às vésperas do julgamento do caso, que está previsto para ir a júri popular nos próximos meses. A produção será exibida no cinema Estação Gávea, na próxima segunda (14), mesmo dia da estreia no Veja+, canal disponível gratuitamente na Samsung TV Plus.
“A produção de documentários é uma extensão natural do que sabemos fazer melhor: contar histórias. Outros virão”, diz Mauricio Lima, CEO da Editora Abril. Serão quatro episódios, com lançamento semanal, que traçam o perfil dos algozes e revelam detalhes sobre a relação turbulenta entre eles. O personagem central da história é o pai de Henry, Leniel Borel, que não esconde a culpa diante dos sinais de alerta dados pelo filho. Em conversa com VEJA RIO, o engenheiro, um dos vereadores mais votados no ano passado, fala também sobre a angústia com a demora da Justiça e se emociona ao tentar dar um novo significado ao caso.
Ao mesmo tempo em que o documentário mantém viva a memória do caso, foi dolorido reviver tudo? Muito. São quatro anos lutando incansavelmente, todos os dias, pelo meu menino. Três pessoas entraram vivas no apartamento, e uma delas saiu morta. O que houve naquela noite? Vivo com essa nuvem cinzenta na cabeça. Todos os indícios mostram que ambos participaram do assassinato e a produção resgata a terrível sequência de fatos, porém de uma forma bastante humanizada.
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O crime foi amplamente noticiado pela imprensa. O que a série traz de novo? A história do meu filho não se resume apenas a sua morte. São resgatados momentos importantes da nossa família, inclusive a nova fase que estou vivendo como pai da Valentina (fruto de um novo casamento, com a médica Larysse Borel Neves Ribeiro). Infelizmente, também falamos sobre as tentativas de manipulação por parte do Jairo, que na época tentou acionar até mesmo o Governador do Rio para exercer o seu poder de influência política e econômica — algo que tenta fazer até hoje.
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Qual lição o documentário deixa? Tudo se desenvolveu em um condomínio na Barra da Tijuca. Se acontece ali, o que não ocorre na Baixada, no interior, em qualquer lugar? O Rio é o estado com mais homicídios de crianças com até 4 anos e esse tipo de violência é algo crescente no Brasil. O documentário levanta reflexões e ajuda na proteção de outras vítimas.
Você nunca escondeu a tristeza por não ter conseguido evitar o que aconteceu com o Henry. Conseguiu superar esse sentimento? Durante muito tempo, questionei se fui omisso. Agora vejo que só havia uma chance de salvá-lo: sumir com ele do Brasil. Se tivesse ido até uma delegacia, com toda aquela influência do Jairo, teria perdido a guarda.
Qual a expectativa para o julgamento? Vivo angustiado com a imensa demora, que ninguém consegue explicar. A estimativa do promotor é que seja realizado entre setembro e outubro, mas já estamos em julho e a data não foi marcada. Tivemos outros casos de grande repercussão, como o da Flordelis, que já houve até condenação. Se eu vacilar, os dois serão soltos.
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Sente que haverá justiça? Nada pode trazer o Henry de volta. Mas ela já começa a acontecer quando conseguimos cassar o CRM do Jairo, que não pode mais ser chamado de Doutor Jairinho, e seu mandato na Câmara dos Vereadores, onde hoje quem ocupa uma cadeira sou eu. Vamos lutar para que eles tenham a condenação máxima e sirvam de exemplo para que pais e mães pensem milhares de vezes antes de cometer uma agressão.
A entrada na política se deu por este motivo? Percebi que há muito a ser feito e esse é um caminho. Um país de 525 anos precisou que a Lei Henry Borel, aprovada em tempo recorde, tornasse esse tipo de homicídio um crime hediondo. Isso foi fruto do nosso empenho. Meu filho se sacrificou para salvar milhares de outras crianças… é o único sentido que consigo dar para tudo o que aconteceu.
A sua ONG também já rendeu frutos? A associação já ajudou mais de 4 000 menores, nunca imaginei um número tão expressivo. Você não imagina o que um ser humano é capaz de fazer, recebemos vítimas de maldades terríveis… Temos psicólogos, psicopedagogos, advogados, um centro social, fora o trabalho de inclusão para jovens atípicos. Tenho uma limitação orçamentária, banquei quase tudo do meu bolso. Como vereador, espero conseguir novos parceiros.
Sua dor foi compartilhada com todo o Brasil. O apoio público foi importante? É difícil demais continuar essa jornada, mas o carinho das pessoas me motiva a não desistir. O caso foi noticiado em 48 países e mostrou para o mundo que mães também matam, com traços de crueldade. Para o promotor, que faz 120 julgamentos no ano, esse é só mais um. Para mim, é a minha vida.