Victor César Carvalho dos Santos: “A saída é atacar a estrutura econômica”

O secretário estadual de Segurança Pública fala sobre as estratégias que vêm sendo usadas diante do crescimento das áreas dominadas pelo crime organizado no Rio

Por Renata Magalhães
Atualizado em 18 jun 2025, 19h14 - Publicado em 13 jun 2025, 08h58
Victor César Carvalho dos Santos
Secretário de Segurança: "O fuzil virou uma ferramenta de dominação territorial" (Jonathan Fernandes/Divulgação)
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Após a operação do Bope que resultou na morte do jovem Herus Guimarães Mendes, de 24 anos, e deixou outras cinco pessoas feridas durante uma festa junina no Morro Santo Amaro, no Catete, o secretário estadual de Segurança Pública, Victor César Carvalho dos Santos, volta a ver a atuação truculenta das forças policiais no centro do debate público.

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O outro lado dessa espiral de violência mostra que as mortes de agentes dobraram nos primeiros meses de 2025, em comparação com o mesmo período do ano passado. Diante desse cenário de tensão crescente, acentuado pelo crescimento das áreas dominadas por grupos criminosos, que aumentaram quase 17% em quatro anos, Santos conversou com VEJA RIO sobre os desafios enfrentados desde que assumiu a pasta, no fim de 2023.

Houve erro no planejamento da ação no Santo Amaro? A operação não seguiu os protocolos da Polícia Militar, que incluem avaliação de risco, análise de conveniência e oportunidade, comunicação da cadeia de comando e ó acima de tudo ó a preservação de vidas. Todos os envolvidos estão sendo ouvidos, tiveram as armas recolhidas para perícia e utilizavam câmeras corporais, cujas imagens estão sendo analisadas. A investigação está em andamento, e me solidarizo profundamente com a família do Herus.

O que explica o alto número de mortes em operações? Sempre há uma fase de investigação, que mostra o que será enfrentado, mas os agentes não detêm o controle sobre todas as circunstâncias. O criminoso pode possuir armamento muito pesado ou estar sob o efeito de drogas e atentar contra a vida do policial, que revida e o resultado é esse.

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Mas a própria população relata truculência por parte da polícia… Aquelas pessoas estão subjugadas, seja por um miliciano ou por um traficante. Jamais poderão declarar abertamente o que aconteceu. Quando é para acusar o agente, o morador coloca a cara. Quando tem que falar do bandido, é sempre de forma anônima, com rosto tampado e voz modificada. De quem os cidadãos têm medo?

Por que o crime organizado ainda é o nosso maior desafio na segurança? Devido ao poder bélico. É extraordinária a quantidade de armamento na mão dos bandidos. A gente não tem essa realidade em nenhum outro lugar do Brasil. Em janeiro, a Polícia Militar apreendeu 84 fuzis, enquanto na Bahia, estado muito maior, foram apreendidos 78 ao longo de 2024.

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As armas têm mais impacto do que as drogas? A cultura do criminoso carioca é o fuzil, que virou ferramenta de dominação territorial. Os entorpecentes representam apenas 15% do faturamento dessas organizações. A Rocinha é a maior comunidade da América Latina, com 80 000 habitantes, e qual o percentual de usuários? Agora, quantas pessoas consomem água, luz, gás, internet? Tudo isso é explorado, seja pelo tráfco ou pela milícia — e são as armas que mantêm o domínio. Só no Rio a gente vê alguém roubar uma carrocinha de cachorro-quente de fuzil.

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O que buscou trazer de diferente na sua gestão? No passado, a tendência era criar o “inimigo número um”, mas esse traficante ou miliciano era preso ou morto em confronto e logo outro entrava. Era como enxugar gelo. O Fórum Brasileiro de Segurança Pública mostrou que, em 2024, o faturamento do crime organizado no país foi de 348,1 bilhões de reais. Passamos apensar sob a perspectiva de um negócio. A saída é atacar a estrutura econômica.

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O que explica o aumento nas infrações do dia a dia, como roubo e furto de celulares? A maioria é praticada por menores. Aí entra um problema da própria legislação: o Degase (Departamento Geral de Ações Sócioeducativas) não tem vagas para receber aqueles que são pegos, então eles voltam para as ruas. Em média, um policial já prendeu o mesmo menor quinze vezes.

Houve também aumento do número de usuários de crack na Zona Sul. Há algum plano junto à secretaria de Saúde? A dependência requer tratamento especializado e não temos aqui a obrigatoriedade da internação. Por mais que haja uma operação, esses nômades vão se deslocando pela cidade como zumbis. Não adianta atacar o efeito e não a causa, que é o vício. O Rio poderia estar fazendo melhor neste sentido.

Existe algum programa voltado para a saúde mental dos policiais? Existem programas de acolhimento, mas se eles admitem alguma questão psicológica, a primeira coisa é o afastamento e a suspensão da arma. Como garantir a segurança depois de tanto se expor? Houve uma demonização e invisibilização da polícia ó as pessoas dão comida e água para alguém que está em situação de rua, mas não dão bom dia para um agente. Sendo que eles saem de casa para proteger e até dar a vida pelos outros, basta estar no lugar errado na hora errada. O policial do Rio não tem segunda chance.

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Como estão usando a tecnologia? Há um programa que integra câmeras de videomonitoramento e alertas de sensores públicos e privados ao sistema de atendimento emergencial 190. As cidades estão cada vez mais cheias, e essas ferramentas são fundamentais para otimizar o recurso humano. Nunca teremos um policial em cada esquina. Com a Inteligência Artificial, ganhamos eficiência.

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O uso de câmeras corporais tem se mostrado eficiente? Somos o estado mais avançado nesse sentido, com 15 000 aparelhos, mas não há estudos que comprovem a efetividade disso. Há um custo muito grande, sem falar na falta de privacidade dos agentes, que precisam até ir ao banheiro com elas ligadas. É preciso equilíbrio para que se tenha a melhor utilização, preservando a intimidade dos trabalhadores e também o sigilo que cada caso exige.

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Tem algum modelo nacional ou internacional que serve como norte? Em relação à tecnologia, Singapura é um case de sucesso, com a integração de todos os bancos de dados da cidade. Essa é uma de nossas metas.

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