“Sou filha da violência doméstica”, diz Luiza Brunet

Aos 60 anos, modelo está de volta à Sapucaí em desfile especial do centenário da Portela, e levanta bandeira do combate à violência sexual

Por Melina Dalboni
Atualizado em 17 fev 2023, 11h02 - Publicado em 17 fev 2023, 07h00
Luiza Brunet -
Luiza Brunet - (Danilo Borges/Divulgação)
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Longe da Sapucaí há seis anos, Luiza Brunet voltará a sambar na frente dos ritmistas. A convite da Portela, de onde foi rainha de bateria por onze anos, ela será uma das personalidades homenageadas no enredo que celebrará o centenário da escola de Madureira, e ainda ocupará o cargo de madrinha de um dos camarotes mais movimentados do Sambódromo. Luiza quer aproveitar os holofotes momescos para dar visibilidade a uma causa que abraça com afinco: a luta pelos direitos das mulheres, em que enfatiza a necessidade de combate à violência sexual e aos assédios tão frequentes neste período do ano. “No Carnaval, acabamos ficando mais vulneráveis e as importunações sexuais acontecem com alta constância”, diz a modelo e empresária, que bate nessa tecla nas redes, em palestras e como embaixadora do Sebrae, do Hope & Justice Foundation (entidade americana que tem como missão prevenir o tráfico de pessoas) e como conselheira da Fiesp. Solteira, nesta conversa franca com VEJA RIO ela conta sobre o abuso sexual que sofreu, os desafios de envelhecer e, claro, sobre o retorno à passarela do samba.

A homenagem da Portela a emocionou? No primeiro momento, fiquei superalegre. Tenho uma ligação muito forte com a escola. Fui a madrinha de bateria que ficou mais tempo na Portela durante esses 100 anos de história. Mas depois, confesso, tive medo.

Medo de quê? Tive um receio de voltar a desfilar após tantos anos. Mas minha filha (Yasmin Brunet) me disse: “Mãe, você faz parte do Carnaval!”. Isso me encorajou. Só avisei ao carnavalesco que não iria de biquíni nem de maiô, que queria uma burca (risos). Ele disse que eu poderia ir como quisesse.

Segundo dados federais, os casos de assédio e violência contra mulheres costumam aumentar 20% no Carnaval. Já passou por isso alguma vez na Avenida? Uma não, muitas vezes. Os caras achavam que, por eu ser modelo, poderiam fazer o que quisessem. Hoje vejo que me enquadrei em muitas violências, mas era uma época que a gente não questionava nada dessa natureza. Eu ia tentando driblar o assédio da forma que conseguia, nesta e em outras situações.

Como se comportava? Certa vez, me ligaram chamando para uma campanha e, quando fui fazer a prova de roupa no hotel, tinha um homem de toalha no quarto com uma garrafa de champanhe e a minha Playboy comigo na capa em cima da mesa. Fiquei furiosa e comecei a gritar e a xingar muito alto, até que as pessoas conseguissem ouvir.

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Apesar dos avanços recentes na legislação, o que ainda pode ser feito para que esse tipo de crime seja evitado? Muitas meninas, quando são assediadas, ficam completamente imóveis, paralisadas, porque não sabem como podem reagir. Só com políticas públicas de educação nas escolas conseguiremos diminuir a violência doméstica e de gênero.

Você relatou ter sofrido abuso sexual na infância. Isso ainda a assombra? Encaro como um capítulo da minha história. Comecei a trabalhar com 12 anos numa casa de família, no subúrbio, quando fui abusada por um homem que vivia no mesmo condomínio. Era uma pessoa gentil, aquele tipo que, quando você diz que precisa de um prego, ele empresta dois. O abusador infantil se veste de uma carapuça muito agradável para ficar imunizado de qualquer suspeita.

Seu ex-companheiro, o empresário Lírio Parisotto, foi condenado por agressão. Olhando em retrospecto, acha que ele deu pistas desde o início do relacionamento de que poderia ser abusivo? Na primeira aproximação, ele já queria mostrar poder. Me mandou um e-mail dizendo quanto ele valia. Tenho essa mensagem até hoje.

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“Quando você está em um relacionamento abusivo, é difícil enxergar. O abusador vai bater na mulher de noite e, de dia, vai pedir perdão”

Depois da agressão que sofreu dele, chegou a ser aconselhada a se calar? Me disseram que eu poderia acabar com a minha carreira. As pessoas têm medo das consequências, do julgamento. A Hebe Camargo, como vimos no filme sobre ela, sofria violência em casa e não falava para ninguém. A Palmirinha também.

O que recomendaria às mulheres para que evitem relacionamentos abusivos antes que evoluam? É importante ouvir o homem dizer como foram os relacionamentos anteriores, observar se ele julga as mulheres, tenta te diminuir. Quando você está em um relacionamento abusivo, é difícil enxergar. O abusador vai bater na mulher à noite e, de dia, vai pedir perdão.

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Essa foi a primeira vez em que se viu em meio à violência doméstica? Não. Sou filha da violência doméstica. Dos 6 aos 12 anos, presenciei meu pai agredir minha mãe. Ela sofreu até se separar. Ele era alcoólatra e usava arma, e eu me lembro de ter ficado no meio dos dois muitas vezes para separar.

Como símbolo de beleza, é mais difícil envelhecer? A busca da juventude é algo muito louco porque, às vezes, a gente perde a mão. Envelhecer não é fácil, mas não tem alternativa. Rugas virão. Cirurgias plásticas não minimizam os anos que você já viveu.

Chegou a ser criticada por procedimentos estéticos? Quando coloco foto no Instagram, tem muita gente que elogia, mas sempre aparece alguém que fala: “Nossa, como ela está velha, nem reconheci”. Vou ficar triste? Não. Como disse a Glória Maria: “Quem me julga hoje não vai deitar no caixão no meu lugar”.

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Aos 60 anos, está feliz solteira? Olha, adoraria conhecer uma pessoa incrível com quem eu pudesse conversar, mas fico muito bem sozinha, amo minha companhia.

Os sex toys ajudam nesta fase? É óbvio. Quem acha que ter vibrador é tabu ainda não experimentou. Ter domínio sobre o seu próprio prazer é a melhor coisa do mundo.

Alguém hoje a faz suspirar? Roberto Carlos. Minha mãe era apaixonada por ele, e herdei essa paixão. Sinto a música dele no meu coração e no meu corpo, mas ele nunca me cantou. Se me chamar agora, eu vou. Fiquei até com um calor aqui (risos).

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