Falar no celular ao volante, furar sinal vermelho, circular acima da velocidade permitida e dirigir embriagado — esses são alguns dos péssimos hábitos cultivados por motoristas que ajudam a inflar uma triste estatística. Os números de acidentes de trânsito, uma parcela deles fatal, vêm escalando no Rio. Entre mortos e feridos, os sete primeiros meses do ano contabilizaram 16 921 vítimas, 1 436 delas atropeladas, quase metade na capital. O dado mais alarmante é o de ocorrências fatais, 751 — 15% mais do que em 2023. “Neste último ano, houve um salto grande. Estamos andando na contramão do processo”, indigna-se o engenheiro Fernando Alberto da Costa Diniz, presidente da ONG Trânsito Amigo e pai de Fabrício, morto aos 20 anos em um acidente na Avenida das Américas, na Barra, em 2003. Fabrício acabou por contribuir na concepção da operação Lei Seca. “Naquele momento, não se falava em outro motivo para esses acidentes, além do álcool. Hoje há que se considerar muitos fatores da sociedade moderna, como estresse e cansaço”, enfatiza.
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Somam-se ainda a essa equação, que, diga-se, tem tudo para dar errado, os ânimos acirrados sob a moldura de uma sociedade polarizada e a permanente pressa com que todo mundo vive. “O resultado é a chamada direção ofensiva, um comportamento de risco cada vez mais frequente”, observa Patricia Sandri, presidente da Associação Brasileira de Psicologia de Tráfego, que congrega profissionais especializados na perícia psicológica para a obtenção da carteira de habilitação e no atendimento às vítimas de trânsito. Ela lembra que, sobretudo após a pandemia, com a saúde mental da população abalada, fechadas, xingamentos e gestos mal-educados se tornaram mais recorrentes, o que se desdobrou em mais sinistros — o termo passou a substituir a palavra acidente entre os técnicos por ser aplicado a qualquer evento que leve a danos a veículos, motoristas ou passageiros.
Uma pesquisa divulgada em maio pela plataforma de idiomas Preply situa o Rio como o segundo estado com o maior contingente “mal-educado” ao volante, atrás apenas de São Paulo. Numa bem-vinda iniciativa para frear os maus índices, a prefeitura anunciou que vai diminuir a velocidade máxima em um conjunto de vias, como a Avenida Lúcio Costa, na orla da Barra e do Recreio, onde os atropelamentos avançaram 40% no último ano — os 70 quilômetros por hora de hoje cairão para 60. Ali, serão ainda instaladas lombadas do tipo Speed Table, que forçam o motorista a tirar o pé do acelerador. Mais linhas redutoras de velocidade, as LRVs, faixas paralelas identificadas pela cor branca (já presentes na Avenida Atlântica e no Aterro do Flamengo), também estão previstas em ruas com alto movimento de pedestres no entorno.
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As medidas, assim como a motofaixa no sentido Lagoa da Autoestrada Engenheiro Fernando Mac Dowell, em São Conrado, e mais radares, são benéficas para a boa convivência no trânsito, mas insuficientes aos olhos dos especialistas. “Nosso maior problema é a falta de educação. Não adianta decorar o Código de Trânsito, as autoescolas têm de ensinar paciência e respeito”, frisa Diniz, defensor de punições mais severas para as infrações. Quem sabe, doendo no bolso, o nível de civilidade, enfim, melhore. Tomara.