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Carla Knoplech

Por Carla Knoplech, jornalista e especialista em conteúdo digital Materia seguir SEGUIR Seguindo Materia SEGUINDO

Chegamos em um Efeito Platô na criação de conteúdo digital?

Clima de exaustão e um certo tédio da previsibilidade que se alcançou no cenário geral de criação de conteúdo pode sugerir que chegamos lá, mas não chegamos

Por Carla Knoplech
Atualizado em 14 jun 2024, 13h10 - Publicado em 14 jun 2024, 13h00
A contradição se estabelece
A contradição se estabelece: como pode um mercado tão forte, onde todos não param de consumir redes sociais e estão hiperconectados estar visivelmente mais monótono? (Unsplash/Divulgação)
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Atire a primeira pedra quem nunca fez uma dieta para a perda de peso que depois de uma bela sequência de eliminação de quilos extras simplesmente parou de emagrecer, mesmo mantendo a restrição calórica e o exercício em dia. Isso se chama Efeito Platô, que é um estágio de progresso estabilizado quando o cenário se acostumou com os estímulos rotineiros e não responde mais como outrora. Comecei a coluna com essa provocação porque o clima de exaustão e um certo tédio da previsibilidade que se alcançou no cenário geral de criação de conteúdo pode sugerir que chegamos lá. É como se apesar de todos os esforços, tenhamos atingido um ápice desse mercado onde o que nos espera a seguir é uma teórica involução do gráfico. Mas, já adianto, não é isso que vai acontecer. O mercado não está em crise, ele está passando por uma transição e caminhando rumo a um amadurecimento. Vou analisar o fenômeno ao longo do texto, mas primeiro vale uma fotografia do momento. 

O segmento de criação de conteúdo digital nunca foi tão grande, alcançou marcas tão astronômicas e tornou-se tão fundamental para a comunicação como hoje. Assisti a uma palestra na semana passada que traz um ótimo exemplo disso. O Itaú, a marca mais valiosa do Brasil em 2024, segundo estudo da Kantar, hoje prevê um futuro amplamente baseado em conteúdo digital e não mais em publicidade, por exemplo. Ao discursar sobre o rebranding de 100 anos do banco e a empreitada ao produzir o show da Madonna na Praia de Copacabana, o CMO do Itaú, Eduardo Tracanella, disse com todas as letras que eles reaprenderam uma maneira de fazer entretenimento e gerar legado a partir dessas duas mega pautas e o quanto isso é irreversível frente a outras formas do banco de se comunicar. Todo o conteúdo gerado a partir da apresentação da cantora, por exemplo, só se equiparou a momentos de Copa do Mundo quando falamos sobre impacto. 

Essa fala dele, aliás, foi no Rio2C, maior evento de criatividade da América Latina que esse ano bateu todos os recordes de público chegando a mais de 50 mil pessoas em seis dias de intensa programação, no Rio de Janeiro. E se você olhar o line up com calma, como eu fiz para escolher o que ia assistir, vai ver que entre os 14 palcos e mais de 1500 palestrantes, temas como “Creator Economy” e “Marketing de Influência” foram quase que onipresentes dentro das diferentes perspectivas dos painéis. Um verdadeiro statement. Mas… Olhem que interessante. Apesar do monotema, quais eram as linhas narrativas presentes nas conversas de quem subiu ao palco? Eu proponho basicamente quatro: como alcançar uma verdadeira conversão, como monetizar, como lidar com a inteligência artificial para a criação de conteúdo e como usar os dados a nosso favor. Podem esticar a corda daqui e dali, mas as preocupações atuais do mercado giram basicamente em cima dessas questões. E é aí que o nosso Efeito Platô entra novamente.

Apesar de crescer cada vez mais em termos absolutos (quantidade de novos entrantes, tempo de conexão dos usuários, atividade em redes sociais e etc), o mercado de criação de conteúdo digital vem sofrendo uma espécie de estagnação quando o assunto é inovação. Seja na proposta de novos formatos, na maneira diferente de contar histórias, na liberdade criativa dos publiposts e até mesmo em uma existência digital que desafie a ordem normativa, a sensação de mais do mesmo é constante. É nesse ínterim que a contradição se estabelece: como pode um mercado tão forte, onde todos não param de consumir redes sociais e estão hiperconectados estar visivelmente mais monótono? São muitos os motivos. 

Pasteurização de formatos 

Em primeiro lugar existe uma pasteurização do que está sendo produzido. Com um mercado orientado por dados que baseia a sua criatividade no que performa melhor ou pior, aponta-se para uma direção editorial focada em resultado do que exclusivamente vai ser mais entregue pelo algoritmo. Com isso, temos perfis de pessoas físicas e jurídicas totalmente dedicados a repetir formatos de produção de conteúdo para darem certo, sem que haja um respiro menos intencional trazendo um ar fresco ao que é feito. Aliás, essa ressaca já se traduz até mesmo no investimento direto que grandes marcas estão fazendo para a contratação de criadores de conteúdo digital externos, que segundo dados do Valor Econômico, Nielsen e YouPix, falam de um investimento menor em contratação de influenciadores digitais por grandes marcas, algo como o equivalente a antes da pandemia de Covid 19, período em que o mundo era bem menos digital.

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Viés de confirmação

Um dos maiores problemas que o mundo vai enfrentar daqui pra frente é o que podemos chamar de “crise epistêmica”, algo que afeta diretamente a percepção de realidade das pessoas. Já vivemos isso atualmente de maneira preocupante, mas tudo leva a crer que com o aumento do uso das redes sociais e da internet sem a devida regulamentação das Big Techs, o problema tende a crescer. Isso acontece quando você tem, por exemplo, um país dividido em duas grandes referências partidárias que consomem canais de informações diametralmente opostos, o que faz com que cada um desses grupos desenvolva uma visão de país e da realidade diferente a do outro. Se o seu candidato ganhou, você acha que a economia vai melhorar e passa a olhar todas as medidas de maneira positiva, se o candidato da oposição ganhou, você acha que está tudo péssimo e só tende a piorar. Essas visões de mundo construídas a partir do que você quer ver, ou seja, a partir do seu viés de confirmação, deixou o segmento de criação de conteúdo digital monótono e vivendo em bolhas, onde as abordagens são esperadas e você basicamente consome o que quer ver para confirmar a sua opinião.

Obsessão por métricas

Money talks, é claro. Mas a obsessão atual por parte das marcas em medir todo e qualquer movimento feito pelos criadores de conteúdo digital é excessiva. Seja porque nem sempre é possível tangibilizar todo e qualquer impacto que uma ação tem, seja porque essa medida muitas vezes não pode ser metrificada na janela de tempo que as marcas pedem. E, digo isso como diretora criativa que tem mais de oito anos nesse mercado e senta nos dois lados da mesa: como agência de marcas e como criadora de conteúdo digital. É claro que precisamos de dados para justificar contratações feitas, medir impacto e traçar estratégias, mas – pasmem – nem todos os movimentos podem ser medidos. Digo isso sempre para os meus clientes, investimento em contratação de creators é também branding e awareness, não só conversão.

Eu poderia me estender em outros diversos motivos, mas vou encerrar a coluna por aqui antes que ela vire um ensaio e voltar ao tema de abertura do texto. Quando uma dieta já não corresponde mais aos seus estímulos após uma jornada vitoriosa, você acha que vale à pena parar de fazê-la, jogar todo o seu esforço fora e ter um reganho de peso ou prefere olhar pra frente e traçar estratégias diferentes para manter o que foi conquistado, além de avançar novamente? É hora do segmento de criação de conteúdo digital se olhar no espelho, ficar feliz com a jornada e traçar um novo plano.  

Carla Knoplech é jornalista, fundadora da agência Forrest, de conteúdo e influência digital, consultora e professora 

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