Déficit de Atenção e Hiperatividade: porque há erros de diagnóstico?
É fundamental que o diagnóstico venha da observação dos pacientes e não apenas de questionários

Estudos afirmam que o Transtorno de Hiperatividade e Déficit de Atenção (TDAH) ocorre em 5,4% da população, ou seja, um caso para cada vinte pessoas. No entanto, a impressão que se tem – e os pacientes que chegam aos consultórios – dão a entender que este número seria muito superior. O fato é que, infelizmente, existe um excesso de casos de diagnósticos de TDAH equivocados.
Na Santa Casa do Rio de Janeiro, um centro de referência para tratamento do transtorno no Brasil, vemos muitos pacientes chegando com diagnóstico prévio de TDAH, às vezes combinado com outros transtornos, como Ansiedade, Autismo ou Deficiência Intelectual, por exemplo. Mas por que isso acontece?
Antes de mais nada, convém esclarecer que o TDAH é composto de três sintomas básicos: Desatenção, Hiperatividade e Impulsividade. O que é preciso deixar claro é que isto pode ser observado em crianças com ou sem transtornos mentais (ou seja, TDAH, depressão, ansiedade, retardo mental ou autismo, entre outros). Um profissional especializado, portanto, precisa estar apto a identificar o que leva a cada um desses sintomas principais (Desatenção, Hiperatividade e Impulsividade).
Dentre os diagnósticos diferenciais mais comuns no TDAH estão retardo mental, depressão, ansiedade, transtorno de aprendizagem (como a dislexia), autismo, além de outros. No entanto, dentre as comorbidades que se apresentam junto com o TDAH (o que dificulta o diagnóstico), estão também ansiedade, dislexia, autismo (embora em número bem inferior ao que se propaga geralmente), e outros.
Portanto, quando um profissional de saúde avalia uma criança ou adolescente com TDAH, é preciso avaliar os três referidos sintomas básicos e o que faz com que estejam ocorrendo. Uma criança desatenta com TDAH, por exemplo, é desatenta a tudo, não apenas quando ela está lendo ou quando tem alguma coisa escrita na lousa da escola. Ou seja, ao contrário do que se imagina, ela não é desatenta porque não entende a matéria.
As crianças com deficiência intelectual têm grande dificuldade de entender certas coisas que são ditas ou colocadas em sala de aula, escritas ou faladas, e com isso elas também se distraem. Essas crianças terão dificuldade no aprendizado formal ou informal, por isso elas são inadequadas em certos comportamentos, porque não aprendem como se comportar em diferentes contextos sociais.
A desatenção pode ser percebida também na ansiedade. Quando uma criança ou jovem tem um quadro crônico de ansiedade, também terá dificuldade de manter a atenção e vive “avoada” quando está preocupada. Uma criança com ansiedade de separação, por exemplo, tem medo de ficar longe do pai ou da mãe ou que alguma coisa aconteça com eles que a afaste dos pais. É o tipo de criança que está em sala de aula, mas com o pensamento em outro lugar: se os pais irão lembrar de buscá-la ao final da aula, por exemplo. Ou também a criança que se preocupa se os pais irão pegar avião. A criança fica ruminando aquele pensamento incessantemente e acaba por se dispersar, mas ela sabe identificar a sua dispersão.
Da mesma maneira, uma criança com ansiedade crônica ou generalizada se preocupa com tudo. Na véspera da prova, ela sofre por antecipação e a desatenção acaba sendo muito importante, mas ela tem um gatilho que a leva a esse quadro. A desatenção na ansiedade ou na depressão, portanto, tem um gatilho. A criança ou jovem é capaz de identificá-la. Já o paciente com retardo mental não consegue identificar essa desatenção pela dificuldade de entendimento inerente à sua condição. Na dislexia, a dificuldade de atenção deriva da impossibilidade de decodificar as palavras. Portanto é fundamental avaliar todas essas variáveis.
A agitação motora é típica do TDAH (é o único transtorno que pacientes apresentam agitação motora). Já a agitação psicomotora é quando há uma explicação psíquica que faça com que a expressão do pensamento passe pela sua expressão corporal, através da agitação ou inquietude. É o caso, por exemplo, de pacientes com déficit intelectual, que padecem de um pensamento tão pobre que acabam não conseguindo se controlar. Consequentemente, ficam excitados ou agitados facilmente, o que leva a comportamentos inadequados e os deixando ainda mais agitado. A criança com autismo também tem agitação psicomotora porque se mudar a rotina, o contexto ou acontecer alguma coisa que ela goste, naturalmente ficará mais excitada. A mesma agitação ocorre entre pacientes ansiosos, que tem uma prova na escola ou se o pai ou a mãe estão demorando a chegar em casa, por exemplo.
Em relação a impulsividade e TDAH, são os casos dos pacientes que agem por impulso: primeiro fazem e logo depois se arrependem. Um paciente com ansiedade age por medo de errar. Um paciente com retardo age porque não domina os códigos da conduta adequada por conta de uma deficiência que o deixa em um contexto mais intelectual mais empobrecido. Já o autista, não tem a percepção social, então ele age porque não consegue ter o entendimento social que ele deveria agir de outra forma.
Portanto, esses três itens – impulsividade, atenção e hiperatividade – são fundamentais. Saber o que leva a cada um deles é o que faz o diagnóstico preciso. Percebemos, com frequência, que muitas crianças e adolescentes tem o diagnóstico errado porque respondem a questionários superficiais – e recebem o diagnóstico a partir de perguntas e respostas, sem avaliar a criança, a pessoa, entendendo o que leva aquela pessoa a ter aquele sintoma. É isso que faz o diferencial do diagnóstico preciso.
Fabio Barbirato é psiquiatra pela ABP/CFM e responsável pelo Setor de Psiquiatria Infantil do Serviço de Psiquiatria da Santa Casa do Rio. Como professor, dá aulas na pós-graduação em Medicina e Psicologia da PUC-Rio. É autor dos livros “A mente do seu filho” e “O menino que nunca sorriu & outras histórias”. Foi um dos apresentadores do quadro “Eu amo quem sou”, sobre bullying, no “Fantástico” (TV Globo).