“Festa de Iemanjá”, que faria 25 anos, é cancelada: “Ganância financeira”
Produtor cultural William Vorhees organiza a festa na praia do Arpoador, de forma orgânica: "Agora virou bagunça", diz

O produtor cultural William Vorhees organiza a festa de Iemanjá há 25 anos, na praia do Arpoador, mas, para 2025, o evento foi cancelado. “Eu e João Nabuco (compositor) criamos essa festa, que tem até trilha sonora e foi sempre feita no sufoco, sem patrocínios e sempre com a ajuda de amigos”, diz.
O motivo, segundo Vorhees, foi a “ganância financeira” de muita gente, com o surgimento da festa “Dia de Iemanjá do Arpoador”, em sua 3ª edição, no dia 2 de fevereiro, com atrações das 8h às 22h e mais de 450 líderes religiosos e artistas de casas do Candomblé e da Umbanda e de grupos de Jongo, Samba e Afoxé. O evento surgiu pós-pandemia, criado pelo músico Marcos André, com o apoio do governo Federal (via Ministério da Cultura pela Lei Paulo Gustavo), do estado e município.
“Depois da pandemia, foi que começou a merda toda. A minha festa tinha expressão porque eu nunca ganhei dinheiro com isso e nunca foi o meu objetivo. O foco era celebrar Iemanjá, agradecer pela praia que a gente sempre teve, pelos momentos felizes que passamos no Arpoador, um dos poucos lugares onde a favela e o asfalto se relacionam em harmonia. Quando começou a era de arrastão, fui lá conversar com a galera pra segurar a onda, tanto que me chamam de síndico do Arpoador porque eu conversava com os vizinhos sobre o que os incomodava: uma vez, o Gilberto (Braga) pediu que não tivessem fotos de artifício por causa dos animais de estimação dele, e nunca mais teve; eu conversava com os surfistas da área, com porteiros, com todos… Agora virou uma bagunça”, diz ele.
A “Festa de Iemanjá” de William e João Nabuco, sempre com cinco mil pessoas em média, começava a produção na Cadeg, na madrugada do dia 2, tinha voluntários, todo o material era biodegradável – com pessoas vigiando para ninguém colocar nada impróprio no barco e depois gente pra limpar a praia.
E segue: “Até conseguimos dar entrada nos papéis de lei de incentivo, fomos contemplados, mas, no processo, apareceu esse grupo, que pega a toda a cultura de preto e joga nas empresas para conseguir incentivo, faz uma coisa faraônica, monta palco – porra, a Pedra do Arpoador já é um palco!… Eu sou um pretinho com bom gosto, sei fazer a parada com o propósito para o que ela nasceu, e esse cara engoliu tudo. Gostaria de perguntar ao Eduardo Paes se ele está sabendo: um evento que sempre foi orgânico virou um circo, e todos os pretos que estão ali estão sendo pagos. Tem o chefe da senzala, me desculpa, mas tenho que falar assim, porque ele pega uma grana maior e dá moedas pra galera. Todos esses terreiros que vão participar agora eu já convidei, e nenhum nunca veio”.
William é tão conhecido pela festa, que tem recebido ligações depois da forte divulgação da outra festa de cariocas, acreditando ser o evento produzido por ele. “A verdade é que você não consegue mais fazer nada orgânico, só com multidões e por dinheiro. Eu amo Ipanema, o bairro que surgem as modas, e não em Balneário Camboriú. Ipanema era elegante, mas agora virou uma cafonice”, diz.
Ele se mantém firme na ideia de não fazer a festa enquanto já tem coro para fazer, mesmo com a outra festa em curso. “Perdeu a graça. Hoje até conversei com Iemanjá pra caramba quando fui mergulhar cedo. E falei ‘mãezinha, não dá pra mim; já não sou um cara jovem e, mesmo jovem, nunca gostei de briga. Eu sou de festa, eu sou de celebração”, finaliza.