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Rita Fernandes

Por Rita Fernandes, jornalista Materia seguir SEGUIR Seguindo Materia SEGUINDO
Um olhar sobre a cultura e o carnaval carioca

Tem Feira das Yabás e o novo disco de Marquinhos de Oswaldo Cruz

Compositor recebe Moacyr Luz e o Samba do Trabalhar e comemora seu sexto disco, o primeiro por gravadora.

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30 abr 2025, 15h22
Feira das Yabás: samba da melhor qualidade ao lado do CCBB (Internet/Reprodução)
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No feriado do Dia do Trabalhador, Marquinhos de Oswaldo Cruz nos presenteia com mais uma edição da Feira das Yabás, ali ao lado do CCBB. Com diversas atividades,  como roda de conversa com Milton Cunha sobre o mercado de trabalho na economia criativa, a tradicional roda de samba, comandada por ele,  receberá  ninguém menos que Moacyr Luz e o Samba do Trabalhador, ícones deste feriado. E claro que não vão faltar as famosas yabás, com suas barraquinhas de comida e seus quitutes, além da feirinha de artesanato, área infantil, bar e barraca de drinks.

Marquinhos vive um momento muito especial. Compositor, criador do Trem do Samba, além da Feira das Yabás, como herdeiro de dois sambistas fundamentais da Portela, Paulo da Portela e Candeia,  lança seu sexto disco “Agbo ato” (Deck). Com um detalhe: só depois dos seus 60 anos é que Marquinhos tem um disco lançado por uma gravadora. Todos os outros cinco foram gravados de forma independente.

“A representatividade deste disco se dá por conta de nunca ter aberto mão do que eu penso, da minha luta, do meu trabalho em relação ao samba. E conquistar com 63 anos espaço numa gravadora para estar gravando nesta perspectiva de quem nunca abriu mão desta luta pelo samba tradicional, dessa ancestralidade ligada ao samba, pra mim foi muito importante. Vira quase que uma vitória coletiva de tantas outras pessoas que seguiram o caminho da gente”, diz.

O disco traz uma reflexão sobre sua rica trajetória, em que desfrutou desde menino do convívio íntimo e das histórias de artistas como, Monarco, Argemiro, Manacéa, Jair do Cavaquinho, para citar alguns. E vai além, com impressões novas registradas na visita que fez à Nigéria, em 2024, como a faixa-título “Agbo ato”. Expressão iorubá, significa o desejo de que tudo dê certo, um sinal de esperança e de tempos bons, segundo Marquinhos.

“Essa viagem me fez compreender muita coisa. Uma delas é que eu tinha uma certa resistência a compor coisas usando o iorubá. Na cabeça da gente, toda tradição do samba é uma tradição bantu, da África Central, do Gabão, de Angola, essa parte iorubá a gente sempre associou mais ao samba da Bahia. E eu não esperava, na Nigéria, voltar tanto a minha infância, lembrar tanto de Oswaldo Cruz, a forma como as pessoas se tratam, como tratam os mais velhos. Foi muito forte chegar na Nigéria e encontrar tantas coisas que a gente faz aqui. Quebrar algumas verdades absolutas. Então esse disco é muito isso”, conta emocionado.

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Marquinhos de Oswaldo Cruz segue o caminho que sempre acreditou, o do samba tradicional.
Marquinhos de Oswaldo Cruz segue o caminho que sempre acreditou, o do samba tradicional. (Leo Aversa/Divulgação)

“Verde bandeira”, música criada há mais de 20 anos em parceria com o Luiz Carlos Máximo, é uma preciosidade de resposta a uma declaração infeliz de um companheiro de ofício que, seduzido pelo caminho mais fácil e medíocre do sucesso, disse, certa vez, que “raiz, se fosse boa, não ficava embaixo da terra”. Resposta bem dada com os versos “Pode tentar me podar/ pode tentar derrubar/fortalecido eu vou nascer de novo”.

“Meu destino, meu ifá”, criada em parceria com Rogério Lessa, faz a ponte entre diferentes matrizes do samba, com “Saravá! Pro meu Rio eu vou voltar/ Com axé pra Portela desfilar/Vou sambar da Central a Irajá com meu amor”. Ainda em parceria com Lessa, o disco também traz a gravação de “Raiz da memória”, lindo samba-enredo derrotado na Portela em 2021.

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“Quando mostrei esse samba para o (violonista) Cláudio Jorge, antes da disputa na quadra, ele me deu um conselho: “Pensa em gravar, não em cantar”. Eu não entendi porque estava na empolgação da disputa. O enredo falava de baobá, de tradição, essas coisas. Agora, ouvindo essa gravação com a cadência merecida, os instrumentos em seus lugares, percebo que ele tinha razão”, explica.

É um disco “à moda antiga, à moda eterna, culto à ancestralidade, como define o mesmo Claudio Jorge. Destaque para os arranjos de Marlon Sette, produtor deste “Agbo ato”, e para as participações de músicos fabulosos como o já citado Cláudio Jorge, e também Carlinhos Sete Cordas (violão sete cordas), Marcio Vanderlei (cavaquinho), Beloba (tantan), Alex Almeida (repique), além dos jovens Camarão Netto e Nando Gigante, da nova geração de percussionistas e filhos de Gaúcho, figura histórica da Ala de Compositores da Portela.

Importante frisar a participação especial de Luizinho do Jêje, outro grande alicerce da banda que acompanha Marquinhos. Convidado por Marlon Sette, ele é um dos mais talentosos percussionistas brasileiros, ogan do Terreiro de Bogum e músico que já acompanhou Maria Bethânia, Gilberto Gil, Matheus Aleluia (Tincoâs), entre outros.

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O disco traz ainda as seguintes faixas: o ijexá “A onça morreu, o mato é nosso”, feito sobre a expressão de Mestre Marçal, com Sette; “O sonho dos meus versos”, feita por Marquinhos para a companheira Maria Machado, que também é inspiração para “A luz de um novo dia”, samba-canção em parceria com Binho Sá; “Mártires dos meus sonhos, outra composição com Luiz Carlos Máximo.

“Boaideiro” reflete a ligação de Marquinhos com as histórias dos sambistas da Portela. “Certa vez, Paulinho da Viola se lembrou deste partido alto, composto por Ventura. Estávamos em frente ao lugar onde era o antigo Bar do Nozinho, ponto sagrado de encontro dos sambistas da velha guarda. Aquele samba me marcou. No ano em que a Portela comemorou seu centenário, 2023, encontrei o Paulinho no desfile e pedi para ele que me cantasse o samba novamente. Mas não tinha a ideia de gravá-lo”, conta Marquinhos. Quando entrou no estúdio, o samba veio à sua cabeça. Ele criou versos para a gravação e o improviso ficou por conta da melodia. “Foi uma forma de homenagear a história da Portela através de um dos seus personagens fundamentais”, completa.

Rita Fernandes é jornalista, escritora, pesquisadora de cultura, música e carnaval.

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